Em sua terceira temporada, série alemã produzida pela Netflix traz vários questionamentos sobre viagens no tempo e a capacidade de alterar o rumo da história, mas não escapa de alguns equívocos científicos.
O entendimento sobre buracos de minhoca é cercado de mistérios, tanto na ciência quanto fora dela. O avanço do conhecimento sobre física e astronomia foi acompanhado pelo aumento do interesse da cultura popular sobre o tema, com vários livros, filmes e séries de ficção científica abordando sua existência. Ao longo da última semana, as discussões se acirraram em torno da terceira e última temporada da série Dark, produção alemã da Netflix que se baseia em elementos dos buracos de minhoca para criar um universo de viagens no tempo e entre diferentes mundos.
A história dos buracos de minhoca está vinculada à dos buracos negros. Quando o físico Albert Einstein propôs a teoria geral da relatividade no início do século 20, um de seus argumentos era que o espaço e o tempo não existem de forma separada no universo, mas como dimensões de um conjunto único chamado espaço-tempo, como proposto por Hermann Minkowski em 1908. Com isso, o espaço-tempo seria maleável e sujeito a dobras em sua configuração.
Representação de buraco de minhoca. Imagem: Shutterstock / Reprodução Live Science.
Outro ponto importante era a existência de “singularidades”, mais tarde chamadas de buracos negros. As singularidades são áreas em que a matéria é comprimida em um ponto infinitamente pequeno, o que faz com que sua densidade seja infinitamente alta e o efeito da gravidade seja tão forte que nem a luz consiga escapar. Mas a comunidade científica achava difícil acreditar que esses buracos existissem na prática justamente pela dificuldade em aceitar que matéria pudesse ter tamanho zero.
Para tentar superar a estranheza, o físico austríaco Ludwig Flamm propôs em 1916 a existência dos buracos brancos, pontos nos quais a matéria seria expelida, de modo contrário ao do buraco negro. Alguns anos depois, Einstein e o físico Nathan Rosen expandiram essa proposta com ajustes matemáticos e indicaram a existência de pontes entre os pontos de engolimento e expulsão da matéria: os famosos buracos de minhoca, oficialmente chamados de pontes Einstein-Rosen e que ligam dois pontos no espaço-tempo. Um detalhe importante que contrasta com o enredo de Dark é que o buraco de minhoca tem apenas duas extremidades, e não três ou mais.
Jonas e Martha, protagonistas da série Dark, que aborda viagens no tempo e entre mundos paralelos. Imagem: Netflix/Reprodução Canal Tech.
A princípio pode parecer estranho que um corpo possa passar por um buraco de minhoca sem se deformar totalmente com a força da gravidade. Quem propôs a ideia de que esses buracos seriam transitáveis foi o físico Kip Thorne, especialista em astrofísica e física gravitacional. Thorne também fez parte de um grupo de pesquisadores do Instituto de Tecnologia da Califórnia que discutiram as possibilidades da viagem no tempo.
Uma das vertentes em voga hoje considera que, para isso, seria preciso deslocar uma das extremidades do buraco à velocidade da luz, mandando-a para o futuro. Assim, até seria possível viajar entre presente e futuro, mas não para o passado anterior à criação daquele buraco de minhoca. Também não seria possível alterar os acontecimentos. Para mudar uma história, seria preciso adotar a teoria de multiverso, formado por vários universos com diferentes versões de cada decisão realizada.
As teorias astrofísicas alimentam um mundo vasto de possibilidades. Mas, por enquanto, não existem evidências de que os buracos de minhoca realmente existam. Não há também uma energia conhecida que seja capaz de criar e manter a estabilidade de um buraco de minhoca. Seria necessária a existência de uma energia exótica que seria extraída de um vácuo e convertida em massa, conversão prevista pela relação entre massa e energia na teoria geral da relatividade. Nada parecido com a energia derivada de um acidente nuclear, como na série alemã.
News: Luanne Caires
Fontes:
What Is Wormhole Theory? (Space)
https://www.space.com/20881-wormholes.html
What Is a Black Hole? (NASA)
https://www.nasa.gov/audience/forstudents/k-4/stories/nasa-knows/what-is-a-black-hole-k4.html
O que são os exóticos ‘buracos de minhoca’ de Einstein e Rosen, que poderiam levar a viagens no tempo e no espaço (BBC Brasil)
https://www.bbc.com/portuguese/geral-53067626
Toda a ciência por trás da série Dark, da Netflix (Gazeta do Povo)
(Editoração: André Pessoni)