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Orangotango se automedica com planta para curar ferida

#Farol de Notícias (Atualidades científicas que foram destaque na semana)

O primata foi visto se automedicando usando uma pasta feita de plantas para curar uma grande ferida na bochecha. É a primeira vez que esse tipo de comportamento é registrado na natureza

Um feito extraordinário e inédito foi observado por pesquisadores no Parque Nacional Gunung Leuser, na Indonésia, onde um orangotango de Sumatra demonstrou habilidades de autocura. Rakus, como foi chamado pelos pesquisadores, foi visto aplicando uma pasta feita de plantas em uma grande ferida na bochecha, resultando em sua completa recuperação em apenas um mês. O comportamento de Rakus marca a primeira vez que um animal na natureza é registrado tratando um ferimento com uma planta medicinal. A descoberta fascinante foi documentada por uma equipe de pesquisa, liderada por Laumer, e publicada na revista científica Scientific Reports.

Em junho de 2022, os pesquisadores avistaram Rakus com uma ferida considerável na bochecha, presumivelmente adquirida durante uma luta com orangotangos rivais.  O animal emitiu “chamados longos”, indicando desconforto, dias antes de os pesquisadores identificarem o ferimento.

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Rakus foi visto por cientistas com um ferimento na bochecha. Fonte: bbci.co.uk

O que se seguiu foi ainda mais surpreendente: Rakus foi observado mastigando o caule e as folhas de uma planta local conhecida como Akar Kuning (Fibraurea tinctoria) , que possui propriedades antiinflamatórias e antibacterianas. A planta é tradicionalmente reconhecida entre as comunidades locais pelas suas propriedades medicinais, especialmente na cura de feridas. As investigações químicas atribuem essa eficácia aos elementos como furanoditerpenóides e alcaloides protoberberina, que dispõem de efeitos antibacterianos, anti-inflamatórios e antioxidantes.

Rakus se alimentou das folhas, aplicou o líquido resultante da mastigação das folhas na bochecha ferida e depois espalhou as folhas mastigadas sobre ela, cobrindo completamente a área afetada, em 25 de junho. O processo foi repetido várias vezes ao longo de um período de aproximadamente 30 minutos.

Em 26 de junho ele foi novamente observado alimentando-se de folhas de Fibraurea tinctoria. Em 30 de junho a ferida estava fechada e em 25 de agosto quase não era mais visível. Visivelmente, a ferida de Rakus não apresentava sinais de infecção após apenas cinco dias e estava completamente cicatrizada em um mês. Além disso, os pesquisadores notaram que Rakus descansou por períodos prolongados, sugerindo que ele estava intencionalmente se recuperando após a lesão.

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Processo de cura da ferida ao longo do tempo. Fonte: Laumer, et al. (2024) springernature.com

“Ele aplicou a pasta repetidamente e, mais tarde, também aplicou uma matéria vegetal mais sólida da planta. Todo o processo durou realmente um tempo considerável – é por isso que acreditamos que ele a aplicou intencionalmente”, explicou Laumer.

Embora os grandes primatas tenham sido observados usando remédios para se curar, essa é a primeira vez que um animal selvagem foi visto aplicando uma planta em uma ferida. Na década de 1960, a bióloga Jane Goodall viu folhas inteiras nas fezes de chimpanzés, e outros documentaram ter visto grandes primatas engolindo folhas com propriedades medicinais. Os cientistas acreditam que Rakus pode ter aprendido esse comportamento por acidente ou ao observar outros orangotangos em seu grupo. 

Quando analisado sob uma lente investigativa, o episódio sugere que os animais selvagens podem ter um conhecimento intrínseco sobre os recursos medicinais disponíveis em seu habitat. Essa conexão íntima com o meio ambiente e o comportamento curativo autônomo de Rakus levantam questões intrigantes sobre a cognição animal e a autossuficiência na natureza, além de seu potencial para aprender e transmitir conhecimento sobre medicina natural. Os pesquisadores planejam continuar observando outros orangotangos para determinar se essa habilidade é comum entre eles.

“Acho que nos próximos anos descobriremos ainda mais comportamentos e mais habilidades que são muito semelhantes às humanas”, sugere Laumer. Essa descoberta destaca a importância de proteger e conservar essas espécies incríveis e seu habitat natural, onde podem continuar a nos surpreender com sua inteligência e adaptabilidade.

 

Colaboração:

Jéssica de Moura Soares sobre a autora

Jéssica de Moura Soares é bacharel em Biotecnologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC), Mestre e agora doutoranda em Bioquímica pela Universidade de São Paulo (USP). Se interessa por iniciativas onde a ciência ajuda a transformar o mundo em um lugar mais sustentável e igualitário. Entusiasta da divulgação científica, acredita que a ciência tem que ser de fácil acesso a todos.

 

Fontes e mais informações sobre o tema:

Artigo Científico de autoria de Laumer, I.B., Rahman, A., Rahmaeti, T. e colaboradores, intitulado “Active self-treatment of a facial wound with a biologically active plant by a male Sumatran orangutan”, publicado na revista Scientific Reports, volume14, p.8932, em 02 de maio de 2024. https://www.nature.com/articles/s41598-024-58988-7#citeas

Matéria no site BBC, intitulada “Orangotango selvagem é visto usando planta para curar ferida”, publicada em 03/05/24. https://www.bbc.com/portuguese/articles/cglv8v6yxjmo

Matéria no site Só Científica, intitulada “Orangotango foi visto tratando feridas com planta medicinal; caso é inédito”, publicada em 07/05/24. https://socientifica.com.br/orangotango-foi-visto-tratando-feridas-com-planta-medicinal-caso-e-inedito/

 

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