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Você não está sozinha: enfrentamos juntas a violência doméstica

Durante distanciamento social, registro de boletins de ocorrência envolvendo violência contra mulheres cai, mas casos de feminicídio e chamadas à polícia aumentam.

A violência doméstica está fortemente ligada à violência contra a mulher: segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública (FBSP) e o Instituto Datafolha, 76% das mulheres que relatam sofrer agressão sofrem de alguém conhecido; 42% das violências contra as mulheres são cometidas em casa. Para enfrentar essa realidade a Lei Maria da Penha, Lei 11.340/2006, tem mecanismos para coibir a violência doméstica contra a mulher: a criação da rede de enfrentamento à violência contra a mulher, da qual as delegacias, centros de atendimento à mulher e o sistema de saúde fazem parte.  A lei também prevê mecanismos como a concessão de medidas protetivas judiciais para afastamento dos agressores da mulher em situação de violência. 

De acordo com a lei, os agressores são familiares, pessoas que convivem na mesma casa ou pessoas que tenham com a mulher relação como casamento, namoro ou qualquer outra relação íntima de afeto. Na violência contra a mulher o perigo está dentro de casa. Atualmente, diante da pandemia da Covid-19, ficar em casa é a medida que se impõe. Quem não presta serviço essencial ou não tem obrigação de sair para trabalhar precisa ficar em casa para se proteger e proteger sua família. Neste contexto, como ficam mulheres em situação de violência doméstica? 

No início das medidas de distanciamento social, foi lançado o documento “Gênero e Covid-19 na América Latina e no Caribe: dimensões de gênero na resposta”, que chama a atenção para a necessidade dos Estados se atentarem a um agravamento da ocorrência de violência contra as mulheres. Neste contexto, aumentam os riscos de violência contra mulheres e o isolamento das mulheres pode implicar em obstáculos adicionais para fugir de situações violentas ou acessar os serviços de enfrentamento.

Dados de 2019 do FBSP mostram que, de todas mulheres agredidas, apenas 10,3% procuraram uma delegacia da mulher; 8% uma delegacia comum; 5,5% ligaram para o 190 (polícia); 15% procuraram ajuda de algum familiar e 52% nada fez. 

 

Violentômetro. Imagem: Procuradoria da Mulher no Senado Federal

 

Após o estabelecimento das medidas de distanciamento social, o FBSP lançou uma nota técnica em abril de 2020, levando em consideração os primeiros dias do distanciamento (março e abril) para seis estados da federação: São Paulo, Acre, Rio Grande do Norte, Rio Grande do Sul, Mato Grosso e Pará. Nos estados analisados houve uma queda no registro de boletins de ocorrência envolvendo a violência contra as mulheres e na concessão de medidas protetivas. Por outro lado, os atendimentos pela polícia militar a casos envolvendo violência doméstica aumentaram, assim como o registro de número de feminicídios.  O Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos percebeu um aumento de 35% de denúncias de violência doméstica no canal 180, que é responsável pelo registro de violência contra as mulheres, em comparação com o mesmo período do ano passado. 

Entretanto, Wânia Pasinato e Elisa Collares chamam a atenção para o fato de que “o aumento pontual no número de registros policiais e chamadas virtuais não necessariamente indica que houve um aumento da violência. Eles podem apenas sinalizar um aumento na procura por esses canais responsáveis por acolher ou dar informações a respeito de casos de violência contra as mulheres.”

Mesmo que possa não ter havido um aumento numérico dessas violências, é certo que a violência acontece com frequência e, devido à maior vulnerabilidade imposta pela necessidade de distanciamento social, é preciso se atentar para os canais de denúncia, como o Disque 180. É importante também que a mulher em situação de violência saiba que pode procurar a rede primária de atenção à saúde, nas unidades básicas de saúde, para ter atenção à violência que sofre. Além disso, as Delegacias de Polícia e de Defesa da Mulher, Defensoria Pública e o Sistema de Justiça também são serviços essenciais. Há também organizações não governamentais que realizam este enfrentamento, como a Organização Tamo Juntas (https://www.tamojuntas.org.br/), que possibilita o contato de mulheres vulneráveis em situação de violência doméstica com advogadas. 

O dado de que 15% das mulheres agredidas buscam a família quando estão sofrendo algum tipo de violência leva a pensar em estratégias nas quais mulheres tenham apoio de pessoas de sua confiança que podem ajudar a romper com o ciclo da violência.

 

Sinal vermelho contra a violência doméstica. Imagem: CNJ

 

Pensando nesta realidade, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em parceria com redes particulares de farmácias, criou a campanha “Sinal Vermelho Contra a Violência Doméstica”, que busca acionar a polícia militar quando uma mulher se dirige a uma farmácia e pede ajuda, como ilustra o vídeo da campanha. Outro exemplo de como a sociedade pode engajar nesta tarefa é vídeo produzido pelo Instituto Lei Maria da Penha, que mostra uma intervenção de uma terceira em uma situação de violência. 

Portanto, é preciso que a sociedade, além de enfrentar a pandemia da Covid-19, esteja atenta e apta a enfrentar a epidemia de violência doméstica, ambos graves problemas de saúde pública. 

 

News: Deíse Camargo Maito

sobre a autora

Fontes:

Governo lança campanha e pede atenção aos casos de violência doméstica (Agência Brasil)

https://agenciabrasil.ebc.com.br/direitos-humanos/noticia/2020-05/governo-lanca-campanha-e-pede-atencao-aos-casos-de-violencia

Pandemia, violência contra as mulheres e a ameaça que vem dos números (Boletim Lua Nova)

https://boletimluanova.org/2020/04/20/pandemia-violencia-contra-as-mulheres-e-a-ameaca-que-vem-dos-numeros/?fbclid=IwAR1fUw3jjt0zan3H89vaJtnZUOEeywwI1qULRv19pYZBFYAfKi2WwXpH874

Sinal Vermelho: CNJ lança campanha de ajuda a vítimas de violência doméstica na pandemia (CNJ)

https://www.cnj.jus.br/sinal-vermelho-cnj-lanca-campanha-de-ajuda-a-vitimas-de-violencia-domestica-na-pandemia/

LEI Nº 11.340, DE 7 DE AGOSTO DE 2006. Cria mecanismos para coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, nos termos do § 8º do art. 226 da Constituição Federal, da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres e da Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher; dispõe sobre a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher; altera o Código de Processo Penal, o Código Penal e a Lei de Execução Penal; e dá outras providências.

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11340.htm

Visível e invisível: a vitimização de mulheres no Brasil. (Fórum Brasileiro de Segurança Pública)

https://www12.senado.leg.br/institucional/procuradoria/proc-publicacoes/relatorio-vitimizacao-de-mulheres-no-brasil-2deg-edicao

Violência doméstica durante a pandemia de covid-19 (Fórum Brasileiro de Segurança Pública)

https://forumseguranca.org.br/wp-content/uploads/2018/05/violencia-domestica-covid-19-v3.pdf

ONU Mulheres. Gênero e COVID-19 na América Latina e no Caribe: dimensões de gênero na resposta (ONU Mulheres)

http://www.onumulheres.org.br/wp-content/uploads/2020/03/ONUMULHERES-COVID19_LAC.pdf?fbclid=IwAR0EEDjzesLlTMu4tHG7P5hvBwZ_aDbnY0bPnZ4LMC2RTNrRGDlbz71OuZ4

 

(Editoração: André Pessoni)

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