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Conhecendo a diversidade da América do Sul: o que as moscas nos dizem?
Destaques – Nova espécie de gênero raro de moscas foi descrita, nomeada de Mayagueza lopesi Costa, Pirani e Oliveira, 2021; – Ela foi coletada no Cerrado do estado de Goiás, o bioma brasileiro mais ameaçado atualmente; – O artigo é o primeiro registro da ocorrência desse gênero na América do Sul e a descrição foi baseada em machos e fêmeas adultos, incluindo fotografias e ilustrações. |
Introdução
Drosophilidae é uma família de moscas com mais de quatro mil espécies mundialmente distribuídas. O gênero Drosophila, descrito por Fállen em 1823, contempla espécies que são tradicionalmente utilizadas em diferentes estudos voltados, principalmente, à genética, à biologia evolutiva e aos estudos de desenvolvimento. Neste contexto, destaca-se a espécie Drosophila melanogaster, descrita por Meigen em 1830, popularmente conhecida como mosca-do-vinagre, que é utilizada como organismo modelo em estudos genéticos há décadas.
A família Drosophilidae é dividida em duas subfamílias chamadas de Drosophilinae e Steganinae, sendo a primeira mais conhecida, com mais espécies descritas, como D. melanogaster, ao contrário da segunda, com menor número de espécies descritas. Por isso o foco em estudar Steganinae, que atualmente é composta por 28 gêneros, dos quais sete ocorrem no Brasil (Rhinoleucophenga Hendel, Leucophenga Mik, Stegana Meigen, Amiota Loew, Pseudiastata Coquillett, Hyalistata Wheeler e Mayagueza Wheeler).
O grupo Steganinae inclui algumas espécies que não sabemos sobre sua biologia e/ou ecologia, por isso para muitas espécies é difícil responder questões como – onde vivem? do que se alimentam? o que fazem?. Algumas espécies predam outros insetos, outras são parasitas e podem se alimentar de secreções animais, como as lacrimais. O gênero Mayagueza é um dos que há lacunas quanto a diversidade, história de vida, alimentação e nicho ecológico. Apenas uma espécie do gênero tinha sido descrita por Wheeler, em 1960, em Porto Rico. Porém, um estudo faunístico no Cerrado de Goiás revelou a presença de uma nova espécie brasileira desse gênero, indicando que há muito a ser conhecido ainda no nosso imenso e rico país.
Material e métodos
Como os ambientes naturais brasileiros estão sendo reduzidos ano a ano, escolhe-se uma unidade de conservação estadual ou nacional para a realização do estudo faunístico, com o intuito de conhecer nossa biodiversidade ainda desconhecida. Neste estudo escolhemos uma unidade de Cerrado chamada Floresta Nacional de Silvânia (FLONA), localizada em Goiás, e coletamos com armadilhas malaise. A análise do material coletado revelou a presença de um macho e uma fêmea de uma espécie nova do gênero Mayagueza. Seguimos então com o processo de descrição das características morfológicas da espécie, e com a documentação por meio de fotografias e ilustrações computadorizadas. Os espécimes referências estão depositados no Museu de Zoologia da Universidade de São Paulo (MZUSP).
Resultados e discussão
A nova espécie recebeu o nome de Mayagueza lopesi, em homenagem ao coletor Professor Welinton Ribamar Lopes, do Instituto de Ciências Biológicas da Universidade Federal de Goiás (ICB/ UFG). A maneira mais fácil de reconhecer a espécie é por suas características do aparelho reprodutor masculino, utilizadas no processo de cópula, como uma parte chamada de surstilo que é fundida e apresenta 9 cerdas específicas chamadas de peg-prensisetae e uma projeção no distifalo.
O gênero Mayagueza ocorre apenas na Região Neotropical e é extremamente raro em coleções entomológicas. O primeiro registro na América do Sul e a descrição da segunda espécie provém desse artigo. Não sabemos ainda sobre seus hábitos alimentares, mas seus parentes mais próximos são gêneros que predam larvas de moscas brancas (Hemiptera) como o gênero Acletoxenus descrito por Frauenfeld. É provável que Mayagueza tenha hábitos de vida similares, mas estudos de campo são importantes para entender melhor essas questões e dar continuidade aos estudos aqui iniciados. Com os resultados aqui obtidos ressaltamos o papel das unidades de conservação em preservar a biodiversidade nacional, em geral, e do Cerrado, em específico, além de ressaltarmos a importância dos estudos de levantamentos faunísticos e taxonômicos para documentar e nomear o desconhecido.
Colaboração:
Gabriela Pirani sobre a autora
Doutora em Entomologia pela USP-RP. Possui graduação em Ciências Biológicas pela UNESP e mestrado em Entomologia pela USP. Tem experiência na área de Zoologia, com ênfase em Taxonomia dos Grupos Recentes.
Sarah Siqueira Oliveira sobre a autora
Bióloga, professora e pesquisadora, amante de insetos, mosquitos e outros animais. Graduada em Ciências Biológicas pela USP. Mestre (2009) e doutora em Ciências (2013) pela USP (Área: Entomologia). Atualmente docente na UFG, com experiência na área de Zoologia, com ênfase em Taxonomia dos Grupos Recentes, em especial: entomologia, taxonomia, sistemática filogenética, biogeografia, evolução, curadoria de coleções, educação e ensino de ciências.
Sávio Cunha Costa sobre o autor
Doutorando em Entomologia pela USP-RP, Mestre em Biodiversidade Animal pela UFG e graduado em Ciências Biológicas pela UFTM.Tem interesse e experiência na área de Zoologia, com ênfase em Morfologia e Taxonomia de Grupos Recentes, além de atuar na área da Educação, em especial, no ensino de Ciências e Biologia.
Artigo Original:
O texto apresentado é uma adaptação do artigo: “Monotypic no more: A new species of the unusual genus Mayagueza Wheeler, 1960 from the Neotropical Region (Diptera: Drosophilidae: Steganinae)”, publicado pela revista Zootaxa em novembro de 2021, de autoria de Costa, S., Pirani, G. e Oliveira, S. O artigo original pode ser acessado em https://doi.org/10.11646/zootaxa.5068.2.8
(Editoração: Fernando F. Mecca e Loren Pereira)