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Cogumelos psicodélicos podem funcionar para aliviar depressão e ansiedade

#Farol de Notícias (Atualidades científicas que foram destaque na semana)

Psilocibina é o nome da substância que tem propriedades psicoativas e é uma promessa para tratamento de transtornos psicológicos.

Um conjunto de dados sobre pesquisas com cogumelos mostrou que seu uso terapêutico tem resultados positivos e duradouros em pessoas diagnosticadas com depressão e são resistentes ao tratamento, não respondendo aos antidepressivos tradicionais. Esses dados levaram a agência reguladora do Departamento de saúde dos Estados Unidos, a Food and Drug Administration (FDA) a considerar a psilocibina, agente psicoativo dos cogumelos, como um medicamento inovador. 

Devido ao potencial da psilocibina para tratamento de transtornos psicológicos, o micologista Paul Stamets afirma que é hora de os fãs de cogumelos psilocibina pararem de pensar em cogumelos para fins recreativos e, em entrevista, enfatizou que “Essas não são mais drogas de festa para jovens. Os cogumelos com psilocibina são substâncias não viciantes e que mudam a vida.”

Como a psilocibina atua no tratamento de depressão e ansiedade?

Indivíduos com transtornos depressivos, de ansiedade, dentre outros problemas psicológicos e neurológicos possuem baixos níveis de serotonina (neurotransmissor conhecido como hormônio da felicidade). Dentre as funções da serotonina pode-se destacar a regulação do sono, ritmo cardíaco, apetite, humor, memória e temperatura do corpo. Por isso, a maioria dos tratamentos visa inibir a recaptação de serotonina nas fendas sinápticas (regiões de comunicação entre os neurônios), isso significa que uma maior quantidade de serotonina estará disponível para efetuar as sensações causadas pela disponibilidade correta do neurotransmissor. Esse tipo de tratamento leva semanas para que a melhora comece a ser observada, isto é, se as drogas funcionarem e os pacientes não forem resistentes ao tratamento convencional.

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Fenda sináptica – região entre os neurônios onde acontece a transmissão de sinais. Em cinza há o exemplo de um neurônio que está transmitindo sinais através da liberação de neurotransmissores e em preto um neurônio com os receptores que irão receber os sinais desencadeados pelo neurotransmissor.  Fonte: Pixabay.

Em contrapartida ao tratamento tradicional, os efeitos observados com o uso de psicodélicos, como psilocibina, podem ser observados dentro de 30 minutos, explica o professor de psiquiatria e farmacologia da Universidade da Carolina do Norte em Chapel Hill, Brian Roth. Ao ingerir a substância psicodélica, ela é convertida em psilocina no intestino e essa é a forma ativa do composto. Esse ativo entra no cérebro através dos mesmos receptores que a serotonina. 

Matthew Johnson, professor de psicodélicos e consciência da John Hopkins Medicine, e David Nutt, diretor da Unidade de Neuropsicofarmacologia da Divisão de Ciências do Cérebro do Imperial College London, explicam que quando alguém consome psilocibina, é observado um aumento geral na conectividade entre áreas do cérebro que normalmente não se comunicam bem. O oposto disso também acontece – redes locais no cérebro que normalmente interagem umas com as outras de repente se comunicam menos. A substância psicoativa cria um “cérebro muito, muito desorganizado”, quebrando os limites normais entre as seções auditiva, visual, executiva e do senso de si da mente. Isso gera – um estado de “consciência alterada”. É essa desorganização que, em última análise, é terapêutica, uma vez que as pessoas deprimidas são continuamente autocríticas e continuam ruminando e repetindo os mesmos pensamentos negativos, ansiosos ou de medo. Os psicodélicos interrompem esses pensamentos, e é possível ver uma saída para a depressão durante o consumo da substância: pensamentos autocríticos ficam mais fáceis de controlar e o pensamento fica mais flexível. 

O que os dados científicos dizem sobre isso até agora?

Ensaios clínicos mostraram que uma ou duas doses de psilocibina, administradas em um ambiente terapêutico, trazem grandes e duradouras mudanças em pessoas depressivas resistentes ao tratamento clássico. “Os dados são fortes para combate desde depressão até Transtorno de Estresse Pós Traumático e cefaleia em salvas, que é uma das condições mais dolorosas que conheço”, disse o neurologista Richard Isaacson, diretor da Clínica de Prevenção de Alzheimer no Centro de Saúde do Cérebro da Florida Atlantic University. 

Em um ensaio com um antidepressivo tradicional, Nutt observou que o tratamento regular não aumentou a conectividade cerebral e, na verdade, não melhorou o bem-estar do paciente tanto quanto a psilocibina. O pesquisador explica que, pela primeira vez, a ciência do cérebro está alinhada com o que os pacientes dizem depois de uma viagem induzida por psicodélicos: “Sinto-me mais conectado. Posso pensar com mais liberdade. Posso escapar de pensamentos negativos e não fico preso em eles.” Ainda se sabe pouco sobre o funcionamento da droga e sobre a consolidação do seu efeito temporal nas pessoas. No entanto, já se sabe que apenas uma dose única do psicodélico,  tem efeito duradouro, de meses há anos, em pessoas diagnosticadas com depressão crônica. 

Os cientistas ainda discutem o uso de microdoses de 0,1 a 0,3 gramas de cogumelos secos de psilocibina, em comparação com a pílula de 25 miligramas padrão que cria a experiência psicodélica completa. O tratamento com microdoses teria um efeito cumulativo.  “Suspeito que a microdosagem pode ter um efeito no humor do paciente e, com o tempo, pode aumentar a resiliência ou melhorar seu bem-estar”, disse Nutt. Ele também acredita que a microdosagem não é capaz de romper os os pensamentos negativos associados à depressão rapidamente como a macrodosagem faria.

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Nem todo mundo é candidato ao tratamento psicodélico, indicam os cientistas. Fonte: Arterra/Universal Images Group via Getty Images/Reprodução CNN Brasil

As pesquisas ainda não conseguiram encontrar nenhum benefício da microdosagem, deixando muitos pesquisadores céticos. A psicóloga experimental Harriet de Wit, professora de psiquiatria e ciência comportamental da Universidade de Chicago, publicou um estudo no início de 2022 que imitava a microdosagem de LSD. No estudo, nem os participantes nem os pesquisadores sabiam o que havia nas pílulas que os participantes tomaram. “Medimos todos os tipos de diferentes respostas comportamentais e psicológicas, e a única coisa que vimos é que o LSD em doses muito baixas produziu alguns efeitos estimulantes no início, que depois desapareceram”, disse Wit.

Apesar dos benefícios do uso dos psicodélicos, os pesquisadores da área alertam aos efeitos colaterais desse tratamento. Estes efeitos  vão desde uma “bad trip” (viagem ruim causada por uma substância psicoativa), até efeitos sistêmicos na pressão arterial, frequência cardíaca e temperatura corporal, de acordo com o Instituto Nacional de Abuso de Drogas. Frederick Barrett, diretor associado do Centro de Pesquisa Psicodélica e Consciência da Johns Hopkins, ressalta que nem todo mundo é candidato ao tratamento psicodélico. Não funcionará em pessoas atualmente em uso de antidepressivos convencionais, uma vez que os receptores em seus cérebros já terão alta disponibilidade de serotonina. Pessoas diagnosticadas com transtorno bipolar ou esquizofrenia, ou que têm histórico familiar de psicose, sempre são excluídas dos ensaios clínicos.

 

Colaboração: Iasmin Cartaxo Taveira sobre a autora

Iasmin Taveira queria ser cientista desde criança e acredita que tornar o conhecimento acessível é o melhor jeito de promover desenvolvimento social. É Biotecnologista pela UFPB, mestre e doutoranda em bioquímica na FMRP/USP.

 

Fontes:

Matéria no site CNN Brasil, intitulada “Psicodélico dos cogumelos pode reativar o cérebro para aliviar depressão e ansiedade; entenda”, publicada em 12/06/2022. https://www.cnnbrasil.com.br/saude/psicodelico-dos-cogumelos-pode-reativar-o-cerebro-para-aliviar-depressao-e-ansiedade-entenda/

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