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Manter a palha sobre o campo e aprimorar os cuidados com o solo contribuem para a redução de gases de efeito estufa
A palha da cana, subproduto da colheita da cana-de-açúcar, é frequentemente utilizada nas usinas para a produção de etanol celulósico (obtido através da quebra das fibras vegetais por meio da hidrólise e posterior fermentação), eletricidade, para retenção de água no solo e atuação no controle da erosão.
O estudo desenvolvido pelo Laboratório Nacional de Biorrenováveis do Centro Nacional de Pesquisa em Energia e Materiais (LNBR-CNPEM) mostrou outro uso para a palha: utiliza-lá para cobrir o campo, garantindo o estoque de carbono no solo e favorecendo, assim, a estabilização do solo e redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE).
A cana captura dióxido de carbono (CO₂) da atmosfera e o acumula na palha e raízes. Quando a cana é colhida, a palha é deixada no campo e, com o tempo, o CO₂ nela contido se transforma em carbono estabilizado no solo, nutrindo-o. Essa transferência de CO₂ da atmosfera para o solo auxilia no balanço de emissões de carbono. Para verificar a eficiência do uso da palha no balanço de carbono, foram propostos três cenários no estudo: remoção de 100% da palha no campo, de 50% e 0% (sem remoção).
“Foi a primeira vez que uma pesquisa incluiu os estoques de carbono do solo na contabilização das emissões de GEE do ciclo de vida da bioenergia derivada da palha”, conta o engenheiro-agrônomo Ricardo Bordonal. A retirada de 50% da palha no campo para a produção de etanol auxilia a mitigar as emissões de GEE, substituindo a gasolina por etanol nos automóveis.
No Brasil, o ambiente é diferente, diz Bordonal: “Como o Brasil já tem uma matriz elétrica limpa, que emite pouco carbono, é mais vantajoso deixar a palha no campo para que o carbono contido nela seja fixado no solo.” No cenário de remover toda a palha para a produção de etanol não há compensação em termos de fixação de carbono no solo.
“A pesquisa traz uma mensagem forte para o setor. Não há custo zero em tirar a palha para produzir etanol ou bioeletricidade”, diz o engenheiro-agrônomo Maurício Cherubin, da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP) e vice-coordenador do Centro de Estudos de Carbono em Agricultura Tropical (CCarbon-USP). “Temos a possibilidade de substituir um ciclo produtivo de pouca atenção ao ambiente por outro, que aproveita a capacidade natural das plantas de capturar carbono da atmosfera e a do solo de armazenar esse carbono”.
Inversamente, o solo degradado leva à baixa produtividade e capacidade de reter carbono, que, em sua maioria, retorna à atmosfera como CO₂. Nesses solos, são utilizados fertilizantes nitrogenados para auxiliar as plantas a crescerem, os quais resultam na emissão de óxido nitroso (N₂O), GEE com potencial de aquecimento global 300 vezes maior que o CO₂. O uso da palha nesses solos degradados disponibiliza carbono estabilizado no solo, nutrindo-o pelo, melhorando a produção nesse local.
Para preservar a biodiversidade e promover a saúde do solo, a agricultura brasileira já adota algumas técnicas, como a rotação de culturas, ocorrendo a alternância entre espécies vegetais em uma mesma área e o plantio direto, no qual os resíduos da colheita permanecem sobre o terreno. Neste último caso, ocorre a absorção de até meia tonelada de CO₂ por hectare por ano.
O estudo auxilia a identificar combinações de plantas e formas de ocupação do solo mais adequadas para compor um sistema de produção que proporcione maior retenção de carbono, tornando o solo mais saudável e aumentando a produtividade agrícola. Diante dos cenários obtidos na remoção de 100% da palha, não há fixação de carbono no solo, com a remoção de 50% usa-se parte da palha na produção de energia limpa, mas, pelo Brasil já possuir uma matriz de energia limpa consistente, não compensa perder essa palha que seria usada para cobrir o campo em atividades industriais, enquanto a não remoção da palha, enriquece o solo com nutrientes e gera ganhos de produtividade.
Colaboração:
Vitor Batista sobre a autora
Vitor Batista é graduando em ciências biológicas na FFCLRP/USP e acredita que a ciência precisa ser difundida para o público com linguagem acessível, sendo alcançada por meio de projetos como a Ilha do Conhecimento.
Fontes e mais informações sobre o tema:
Matéria na revista Pesquisa FAPESP, intitulada “Boas práticas produtivas podem reduzir emissões de carbono no campo”. https://revistapesquisa.fapesp.br/boas-praticas-produtivas-podem-reduzir-emissoes-de-carbono-no-campo/