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Como criar um medicamento “padrão ouro”?
DESTAQUES: – Os testes randomizados e duplo-cego são de grande importância para garantir que estudos sejam confiáveis e não enviesados; – Estas práticas, também chamadas “padrão ouro”, são uma forma de testar os efeitos de um remédio no corpo humano, a fim de garantir a eficácia e a segurança do medicamento; – Experimentos seguindo este padrão alocam aleatoriamente os pacientes em grupos experimental e controle, de modo que nem eles, nem os pesquisadores, saibam em qual grupo estão, até o fim do tratamento; – Garante-se, assim, que os resultados sejam devido ao medicamento sendo testado, e não a algum outro fator. |
Para a produção de vacinas contra o vírus SARS-CoV-2, causador da atual pandemia de COVID-19, são utilizados protocolos monitorados minuciosamente por agências de controle de saúde, como, no caso do Brasil, a Anvisa (Agência Nacional de Segurança Sanitária).
Todo estudo clínico de um novo medicamento, inclusive da vacina contra a COVID-19, passa por 4 fases distintas antes de sua submissão ao respectivo órgão de controle do país, segundo a descrição do Ministério da Saúde. Na primeira e na segunda fases, temos os estudos iniciais do produto, em que estes são desenvolvidos. Dessa forma, na primeira fase, por exemplo, o produto é avaliado em um pequeno grupo de voluntários (entre 20 a 100 pessoas), geralmente sadios. Ao passarem para a segunda fase, os estudos são feitos em portadores de determinadas doenças, buscando descobrir se é segura a progressão da pesquisa com base na resposta desses grupos. Assim, ao chegarem na terceira fase, podem ser instituídos testes com grupos de indivíduos diversos e maiores, de 300 a 3000 participantes, os chamados testes randomizados, tendo como objetivo principal determinar a relação risco/benefício do medicamento, anotando aqui algum possível tipo e perfil das reações adversas. Na quarta fase, o produto já foi aprovado e procura-se confirmar se os resultados obtidos na fase anterior são aplicáveis a uma grande parte da população doente. De forma geral, nessas fases são testadas as respostas imunológicas de diferentes grupos de voluntários e, caso haja resultados promissores, os testes progridem para as etapas definidas. Para tanto, destaca-se o modelo de teste randomizado e duplo-cego, principalmente na terceira fase de testes, como uma ferramenta importante na ciência contemporânea.
Estudos usando estes métodos, também chamados de estudo “padrão ouro”, são um tipo de ensaio clínico, ou seja, uma forma de testar os efeitos de um remédio no corpo humano, a fim de garantir a eficácia e a segurança do medicamento. No teste randomizado duplo-cego, os médicos não sabem quais pacientes receberam o medicamento em testagem e quais receberam um placebo. O placebo é um “medicamento” que não tem princípio ativo, podendo ser, em alguns casos, uma pílula de farinha, por exemplo. Esse método é estabelecido para que não ocorra nenhuma influência nos resultados, como o paciente ter uma resposta psicológica positiva ou negativa em relação ao tratamento caso saiba o que lhe foi aplicado.
Nesse sentido, um estudo “duplo-cego” divide os pacientes em dois grupos distintos: em um deles, os indivíduos receberão o tratamento ativo, seja ele uma vacina ou um fármaco, por exemplo; enquanto o outro grupo irá receber o placebo. O primeiro é o grupo experimental e o segundo, o controle. Já a parte do “randomizado” diz respeito à separação aleatória das duas amostras, controle ou experimental, garantindo que cada paciente que participe do ensaio clínico tenha a mesma chance de ser alocado no grupo que receberá o tratamento ou o placebo.
Os testes randomizados e duplo-cego possuem grande importância para que os estudos sejam conduzidos da maneira correta e os resultados sejam confiáveis e não enviesados. Distribuir os grupos de pessoas aleatoriamente e de forma que os pesquisadores não saibam o que cada participante do estudo está recebendo é importante pois evita-se que haja interferências e manipulações devido a interesses pessoais. Além disso, também afasta a possibilidade de que os grupos não sejam tratados da mesma forma – por exemplo, evita que pesquisadores tratem melhor o grupo experimental. Assim, os resultados da pesquisa serão válidos e poderão ser usados para comprovar a eficácia ou não de fármacos.
Estes altos parâmetros de qualidade dos estudos só trazem benefícios para os envolvidos: a ciência ganha credibilidade por gerar resultados precisos e que correspondem à realidade, e os pacientes usufruirão de um fármaco com uma eficácia comprovada e real. Estudos publicados em revistas predatórias, geralmente, lançam mão de vieses e manipulações que seriam evitados por esse método, mas são feitos para comprovar um ponto de vista específico ou atender tanto a interesses políticos quanto pessoais. A desinformação ocasionada por estudos de qualidade duvidosa ou comprovadamente manipulados pode ter efeitos nefastos, como os que serviram de alicerce para o horror do circo da cloroquina: um medicamento que não possui efeito algum contra a COVID-19 sendo usado por milhares de indivíduos, colaborando apenas com efeitos adversos e negativos para o organismo.
Colaboração:
Amanda Miranda França Zanel sobre a autora
Guilherme Maia Fernandes sobre o autor
Guilherme Rodrigues de Mira sobre o autor
Jackeline Marino Lucas sobre a autora
Letícia Cioca Alves sobre a autora
Lucas Henrique de Melo Falcione sobre o autor
Sayuri Higa sobre a autora
Os colaboradores da semana são alunos do curso de graduação em Ciências Biomédicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP, assim como autores de outros conteúdos deste mês.
Fique de olho nas proximas semanas!
Fontes e referências bibliográficas:
Matéria no site Infoescola, intitulada “Estudo duplo-cego”, acessada em 03/11/2021. (Website)
Matéria no site Infoescola, intitulada “Estudo clínico randomizado controlado”, acessada em 03/11/2021. (Website)
Matéria no site Loema Instituto de Pesquisa Clínica, intitulada “Como é possível controlar a segurança dos pacientes em projetos duplo-cego”, publicada em 30/06/2017. (Website)
Matéria no blog Cultura Científica, intitulada “O estudo duplo-cego”, publicada em 24/06/2008. (Website)
Matéria no site Wikipedia, intitulada “Estudo clínico randomizado controlado”, acessada em 03/11/2021. (Website)
Matéria no site da Sociedade Brasileira de Profissionais em Pesquisa Clínica, intitulada “Quais as fases de uma pesquisa científica”, acessada em 03/11/2021. (Website)
Matéria no site da Johnson & Johnson, intitulada “The 5 stages of COVID-19 vaccine development: what do you need to know about how a clinical trial works”, publicada em 23/09/2020. (Website)
Matéria no site Edge, intitulada “2017: what scientific term or concept ought to be more widely known?”, acessada em 03/11/2021. (Website)
Artigo científico intitulado “Inventing the randomized double-blind trial: the Nuremberg salt test of 1835”, publicado na revista Journal of the royal society of medicine em 2006, de autoria de Stolberg, M. (Website)
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(Editoração: Beatriz Spinelli, Fernando Mecca, Eduardo Borges e Loren Pereira)