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Diabetes: do papiro à biotecnologia

#Ciência et al. (Especiais temáticos repletos de informações científicas)

Resumo das principais descobertas sobre a diabetes e o seu tratamento

DESTAQUES:
– A diabetes é uma doença relacionada a problemas na produção ou na ação da insulina, a qual controla os níveis de glicose no sangue;
– Desde 1500 a. C. existem relatos sobre a doença, mas o primeiro tratamento surgiu apenas em 1921;
– Hoje, utiliza-se principalmente a técnica de DNA recombinante para produzir insulina para o tratamento de diabetes;
– O SUS é responsável por tratar a diabetes e quaisquer problemas decorrentes dela.

A diabetes mellitus é uma doença caracterizada pela deficiência na produção de insulina e/ou pelo seu funcionamento irregular. A insulina é um hormônio secretado pelo pâncreas, cuja função é regular o nível de glicose no organismo. Ao identificar a presença de moléculas de glicose, o pâncreas secreta insulina como um sinalizador que causa a abertura de canais de glicose nas células musculares, adiposas e hepáticas, permitindo que a glicose entre nelas. Assim, o corpo a utiliza como fonte de energia e reserva uma parte dela para uso posterior. 

Existem dois principais tipos de diabetes: a diabetes mellitus tipo 1 (DM1), que é causada pela destruição das células beta, responsáveis por produzir a insulina, e localizam-se em estruturas do pâncreas chamadas de ilhotas de Langerhans (que recebem este nome por terem sido descritas por Paul Langerhans e parecerem-se com pequenas ilhas quando observadas ao microscópio). Os processos que causam a doença ainda não são claros, mas sabe-se que células do sistema imunológico, denominadas linfócitos, reagem a um processo inflamatório irregular nas ilhotas e, equivocadamente, atacam as células beta. A queda no número de células funcionais ocasiona a falta de insulina e, consequentemente, a hiperglicemia. Esse tipo de diabetes é, geralmente, identificado na infância e na adolescência, porém também pode ser diagnosticada em adultos. Já a diabetes mellitus tipo 2 (DM2) ocorre quando o organismo não reconhece a insulina produzida ou não produz insulina suficiente para controlar a taxa glicêmica. Este tipo de diabetes está mais associado à obesidade, má alimentação e sedentarismo, correspondendo a 90% dos casos de diabetes. 

O mais antigo relato de diabetes é datado de 1500 a. C., e está presente em um documento médico do Antigo Egito, conhecido como papiro de Ebers. Já o nome diabetes mellitus foi dado por Arateus, um médico da Grécia Antiga. Durante o primeiro século depois de Cristo, a diabetes era mencionada por muitos povos, como hindus e árabes, que relatavam que a urina dos pacientes com essa doença era adocicada. Avicena, um médico árabe, foi pioneiro em relacionar a diabetes com algumas complicações, como a gangrena diabética e a perda da função sexual. 

No entanto, apenas em 1812 a doença foi reconhecida formalmente pela medicina moderna, ao ser publicada no The New England Journal of Medicine, revista médica renomada. Há relatos de que, em 1889, já se reconhecia a origem da diabetes no pâncreas: os médicos alemães Oskar Minkowski e Joseph von Mering retiraram os pâncreas de cachorros e, com isso, houve o óbito deles por diabetes. No ano de 1910, Edward Sharpey-Schafer elaborou uma hipótese de que a doença seria causada pela deficiência de uma única substância química, produzida no pâncreas pelas células das ilhotas de Langerhans. Por isso, ele batizou essa substância com o nome de insulina, derivado da palavra latina insula (ilha). 

O tratamento para a diabetes mellitus teve origem em 1921, quando Frederick Banting e Charles Best injetaram em cachorros diabéticos extratos de células das ilhotas de Langerhans retiradas dos pâncreas de cachorros saudáveis, revertendo o quadro de diabetes. Em seguida, trabalhando com pâncreas bovino, em conjunto com John Mcleod, eles purificaram a insulina e conseguiram tratar uma pessoa portadora dessa doença. Dessa maneira, o uso de insulina para o tratamento da diabetes mellitus ficou reconhecido e utilizado no mundo todo.

insulina diabetes
Linha do tempo com as principais descobertas relacionadas à diabetes. Imagem: arquivo pessoal.

Inicialmente, a insulina de porcos era coletada e injetada em pessoas diabéticas como forma de tratamento para DM1, para que esta substituísse a insulina não produzida pelo paciente. Entretanto, na década de 1980, os avanços da biologia molecular e da biotecnologia permitiram que a insulina humana fosse sintetizada por meio de uma técnica chamada “DNA recombinante”. O método permite que o gene humano responsável pela produção de insulina seja isolado do restante do DNA humano e adicionado ao DNA de uma bactéria, de forma que ela passe a produzir insulina similar à produzida pelo organismo humano. A bactéria não utiliza esse hormônio, de modo que a insulina produzida por ela começa a se acumular e pode ser coletada para uso terapêutico em seres humanos. Essa insulina sintética é muito mais parecida com a produzida naturalmente pelo homem do que a insulina suína, utilizada até então. Portanto, o risco do sistema imunológico do paciente reconhecer esse hormônio como um invasor e atacá-lo é muito menor, reduzindo assim os efeitos colaterais do tratamento. Posteriormente, descobriu-se que a produção de insulina sintética com algumas modificações nos seus componentes é capaz de prolongar o tempo de ação do hormônio, criando os chamados “análogos de insulina”. 

Podemos observar que desde a descoberta da insulina, há 100 anos, houve muitos avanços científicos que resultaram no aprimoramento do tratamento a utilizando. Além dos métodos citados acima, há a formulação em pó da insulina humana (que pode ser inalada e absorvida pelo sistema respiratório). Todos esses avanços na insulinoterapia resultaram em um tratamento menos invasivo para os pacientes, além de permitirem um melhor controle metabólico dessa substância. 

Atualmente, o tratamento da diabetes tipo 1 é realizado principalmente utilizando o esquema basal-bolus ou por bombas de infusão contínua de insulina subcutânea, que buscam se aproximar o mais fielmente possível à liberação de insulina pelas células em pessoas saudáveis. Esses métodos de tratamento com insulina permitem a redução de complicações da diabetes tanto microvasculares, como a lesão nos vasos da retina, quanto macrovasculares, como a obstrução das artérias pelo colesterol, tornando o tratamento mais confortável para os pacientes.

No Brasil, o SUS é responsável não só por garantir o tratamento da diabetes, como também tratar possíveis problemas decorrentes da doença, garantindo aos pacientes o direito a cirurgias e medicações de forma totalmente gratuita. O sistema fornece diversas opções de tratamento, como a insulina humana NPH (insulina com adição de protamina) e a humana regular (insulina de menor variabilidade, de preferência para os tratamentos do tipo basal-bolus e por bombas de infusão), e também o direito a cirurgias, como a bariátrica, que podem ser requisitadas devido a complicações relacionadas à diabetes.

 

Colaboração:

Cassiana Mathias F. dos Santos sobre a autora            

Ewelyn Dalize da S. Siqueira sobre a autora   

Karol Zuculim Sartori sobre a autora           

Letícia Lorenzi sobre a autora            

Mariane Barbosa de Oliveira sobre a autora         

Cassiana Mathias F. dos Santos, Ewelyn Dalize da S. Siqueira, Karol Zuculim Sartori, Letícia Lorenzi e Mariane Barbosa de Oliveira são alunas do curso de graduação em Ciências Biomédicas da Faculdade de Medicina de Ribeirão Preto – USP, assim como autores de outros conteúdos deste mês. Fique de olho para saber mais!

 

Fontes e referências bibliográficas:

Artigo científico intitulado “Diabetes recordando uma história”, publicado na revista Hupe em 2015, de autoria de Gomes, M.

Matéria no site de Drauzio Varella intitulada “A história do diabetes”, publicada em 2020. (Website)

Matéria no site Fiojovem intitulada “Insulina: avanços da pesquisa”, publicada em 2008. (Website)

Artigo científico intitulado “Insulin Action Research and the Future of Diabetes Treatment: The 2017 Banting Medal for Scientific Achievement Lecture”, publicado na revista Diabetes em 2017, de autoria de Accili, D.

Matéria no site da Sociedade Brasileira de Diabetes intitulada “Tipos de diabetes”. (Website)

Artigo científico intitulado “Aspectos imunológicos do diabetes melito tipo 1”, publicado na Revista da Associação Médica Brasileira em 1999, de autoria de Balda, C. e Pacheco-Silva, A.

Artigo científico intitulado “Complicações microvasculares em diabéticos Tipo 2 e fatores associados: inquérito telefônico de morbidade autorreferida”, publicado no website SciELO Brasil em 2015, disponível em: https://www.scielo.br/j/csc/a/BPxqRJZkHdd6x4D4jgzDdFh/?lang=pt#

Artigo científico intitulado “Diabetes Melito tipo 1 autoimune: aspectos imunológicos”, publicado na revista Universitas: ciências da saúde em 2016, de autoria de de Souza, A.; Albernaz, A. e Sobrinho, H.

Artigo científico intitulado “A Evolução da Insulinoterapia no Diabetes Melito Tipo 1”, publicado na revista Arquivos brasileiros de endocrinologia e metabologia em 2008, de autoria de Pires, A. e Chacra, A.

Matéria no site PEBMED intitulada “Diabetes: SUS passa a oferecer tratamentos relacionados à doença”, publicada em 2019. (Website)

(Editoração: Beatriz Spinelli, Fernando Mecca e Eduardo Borges)

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