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Pesquisa sugere que o sexo pode influenciar o modo como o sistema imunológico humano responde à dexametasona.
A dexametasona é um um dos principais medicamentos utilizados no tratamento da COVID-19 com comprovação científica. Esse medicamento é um corticosteróide, ou seja, é produzido sinteticamente em laboratório com base em hormônios e possuem uma potente ação anti-inflamatória. Seu principal benefício consiste em diminuir a taxa de mortalidade dos pacientes hospitalizados com COVID-19. Um estudo publicado na revista Nature Medicine, mostrou que o uso dessa droga é mais eficiente para tratar indivíduos do sexo masculino do que indivíduos do sexo feminino. Assim, os pesquisadores alertam para a possibilidade de que a terapia básica para o tratamento da COVID-19 beneficie apenas metade da população, o que representa um grande problema.
Este trabalho teve início em uma análise do banco de dados provincial de todas as admissões à UTI durante a pandemia em Alberta, no Canadá. Essa análise mostrou que a terapia com dexametasona em Alberta reduziu o número de homens morrendo, mas não teve efeito na população feminina. Partindo disso, os autores coletaram sangue de pacientes com COVID-19 e não-COVID-19 que foram admitidos em UTIs de Calgary (cidade da província de Alberta) com dificuldades respiratórias graves e analisaram o perfil do comportamento das células do sistema imunológico. Os pesquisadores analisaram simultaneamente os estados funcionais de milhares de células do sistema imunológico de cada paciente através de técnicas de proteômica (que consistem em análises globais e em larga escala de conjuntos de proteínas em uma amostra biológica), sequenciamento de RNA de célula única (o que permite entender a dinâmica de sinalizações que podem ocorrer para regular atividade das células) e bioinformática (ciência que visa a análise, interpretação e processamento de dados biológicos). Com isso, foi possível entender o comportamento celular em diferentes estágios da doença, bem como analisar os efeitos do tratamento com dexametasona.
Na maioria das infecções virais, as proteínas chamadas interferons atuam para eliminar o vírus rapidamente. No entanto, na COVID-19 é observado uma sinalização dessas proteínas com atividade pró-inflamatória por um tempo prolongado, o que leva a danos maiores nos órgãos dos indivíduos. Os autores explicam que a sobrevivência ao SARS-CoV-2 depende de atingir um equilíbrio entre a estimulação do sistema imunológico para eliminação viral durante o estágio inicial e, subsequentemente, restringir essa resposta em estágios posteriores para limitar os danos induzidos pela imunidade. Nesse contexto, os autores observaram que indivíduos do sexo masculino têm uma resposta inflamatória mediada por interferons exagerada, por outro lado, essa resposta exagerada é pouco observada em mulheres. Assim, o tratamento com dexametasona tem um efeito mais relevante no tratamento da COVID-19 em homens.
Os pesquisadores explicam ainda que este trabalho teve algumas limitações que devem ser levadas em consideração. Dentre as limitações é importante destacar que por não ser um estudo randomizado e considerando o pequeno número amostral dessa pesquisa, as conclusões deste trabalho podem introduzir inadvertidamente viés de seleção e limitar a generalização dos achados de dexametasona. Apesar disso, eles se animam com os caminhos interessantes que essa pesquisa pode tomar para entender a resposta imunológica frente à dexametasona e COVID-19. Em entrevista, os pesquisadores afirmam que é importante pensar em fazer terapias que beneficiem mais pessoas, ou terapias individualizadas, também conhecidas como medicina de precisão ou personalizada.
Colaboração: Iasmin Cartaxo Taveira sobre a autora
Iasmin Taveira queria ser cientista desde criança e acredita que tornar o conhecimento acessível é o melhor jeito de promover desenvolvimento social. É Biotecnologista pela UFPB e faz mestrado em bioquímica na FMRP/USP.
Fontes e mais informações sobre o tema:
Artigo científico intitulado “Dexamethasone modulates immature neutrophils and interferon programming in severe COVID-19”, publicado na revista Nature Medicine em 2021, de autoria de Sinha e colaboradores. https://www.nature.com/articles/s41591-021-01576-3
Matéria no site Science Daily, intitulada “Why drug used to treat critically ill COVID-19 patients may only benefit males”, publicado em 16/11/2021. https://www.sciencedaily.com/releases/2021/11/211116175053.htm