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Grande evento de extinção em massa causado por lodo tóxico pode acontecer novamente

#Farol de Notícias (Atualidades científicas que foram destaque na semana)

Considerado um sintoma recorrente, a proliferação de microrganismos em ambientes de água doce em decorrência de aquecimento global é capaz de gerar extinção em massa desde eras passadas.

Nos últimos 4 bilhões de anos, a Terra passou por eventos cataclísmicos nos quais as espécies levadas à extinção superaram em número os sobreviventes. Dentre esses eventos, o pior ocorreu no final do Período Permiano (cerca de 290 a 248 milhões de anos atrás), evento chamado por paleontólogos de “Grande Morte”. Foi caracterizado por um aumento significante da temperatura do planeta terra, que coincidiu com erupções vulcânicas em uma “grande província ígnea” conhecida como Armadilhas Siberianas.

No estudo liderado por Chris Mays, professor de paleontologia na University College Cork, foi observado que que o crescimento descontrolado de algas e bactérias que liberam substâncias tóxicas, está ligado ao desmatamento, perda de solo e aquecimento global. Além disso, foi possível estabelecer uma relação entre as mudanças climáticas e o desmatamento, que podem gerar florações microbianas recorrentes, inibindo a recuperação de ecossistemas de água doce por centenas de milênios. Os autores também explicam que comunidades microbianas proliferaram em corpos de água doce e salobra (por exemplo, oceanos), com concentrações de algas típicas de alguns crescimentos descontrolados modernos. Assim, além de fornecer informações cruciais para entender a vida ao longo das eras geológicas, o trabalho também fornece informações que servem de alerta para a atualidade. O artigo foi publicado na revista Nature Communications em 2021.

Climas “hipertérmicos” magmaticamente (referente a magma) desencadeados, caracterizados por aumentos muito rápidos na temperatura e CO2 atmosférico, são causalmente ligados à maioria das extinções em massa ou renovação biótica. No final da era geológica conhecida como Permiano, os ecossistemas terrestres, marinhos e de água doce entraram em colapso.

Pesquisas de Mays e colaboradores mostram que, o aumento da temperatura e de influxo de nutrientes geralmente causados por erosão após desmatamento nesse período está relacionado a proliferação de bactérias e algas, tornando rios e lagos praticamente inabitáveis. Assim, o atual cenário ecológico traz preocupações contemporâneas e futuras, uma vez que esse crescimento exacerbado de microrganismos é essencialmente motivado pelo aumento da temperatura e concentração de CO2.

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Escala geológica. Fonte: Pinterest

Como aconteceu a pesquisa que levou a entender a extinção em massa da era Permiana?

Em conjunto com outros pesquisadores, Mays analisou amostras obtidas das costas rochosas do leste da Austrália. Nesta região é possível observar uma diferença clara entre as formações rochosas: havia vários leitos de carvão imprensados ​​entre os arenitos e lamitos nos níveis mais baixos de rochas que datam do final do Permiano (cerca de 259 milhões a 252 milhões de anos atrás). Eles representam os restos compactados e fossilizados das florestas pantanosas que existiam na região. Em contraste, as rochas mais jovens e sobrejacentes que abrangem a parte inicial do período Triássico (era posterior ao período Permiano), cerca de 252 milhões a 247 milhões de anos atrás, são desprovidas de carvão. Isso reflete a vasta extinção ocorrida no período Permiano. Assim, essa região representou para os pesquisadores uma chave para entender a história da vida na Terra. 

Nas porções de rochas mais jovens, que refletem o período Triássico, não era possível observar quase nenhum tipo de fóssil, apenas tocas simples que provavelmente foram escavadas por pequenos répteis semelhantes a mamíferos. Esses seres também foram um dos poucos sobreviventes da catástrofe, pois sua estratégia de escavação provavelmente forneceu um refúgio da superfície escaldante. A partir desse material de rochas com poucos fósseis foram obtidas amostras que em seguida foram divididas em 3 lotes. Cada lote tinha um objetivo de estudo: obter estimativas precisas de idade para o evento de extinção, calcular as temperaturas que prevaleceram durante o final do Permiano e examinar as amostras de fósseis microscópicos de esporos de plantas e pólen, bem como algas e bactérias microbianas, para construir um relato passo a passo da ecologia no período do colapso e recuperação. 

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Antes do evento de extinção do final do Permiano, os pântanos repletos de árvores floresceram (à esquerda). Após o evento, o crescimento excessivo de algas e bactérias impediu a recuperação desses ecossistemas (à direita). Crédito: Victor Leshyk / Reprodução: Scientific American

Juntando as informações dos lotes, os pesquisadores conseguiram entender o que gerou a grande extinção desse período. As estimativas de idade também determinaram a duração das mudanças observadas na área de Sydney: o pico de temperatura e o colapso do ecossistema ocorreram ao longo de dezenas de milhares de anos. Essa mudança de condições geologicamente rápida levou a vida das zonas temperadas à extinção  e obrigou animais da região a viver meio período nas temperaturas mais frias do subsolo.

As estimativas de idade das amostras revelaram que o colapso do ecossistema coincidiu com as primeiras erupções vulcânicas das Armadilhas Siberianas. Além disso, as análises dos microfósseis mostraram que a abundância de esporos de plantas e pólen caiu precisamente no topo do último depósito de carvão do Permiano, refletindo o desmatamento quase total da paisagem.

No estudo foi observado que algas e bactérias proliferaram logo após a extinção, infestando ecossistemas de água doce com um lodo nocivo. Na verdade, eles atingiram concentrações típicas de crescimento microbianos modernos descontrolados, como aqueles no Lago Erie (nos territórios dos EUA e Canadá) em 2011 e 2014. Como o crescimento microbiano explosivo leva a diminuição da disponibilidade de oxigênio, e muitos micróbios produzem subprodutos metabólicos tóxicos, esses eventos podem causar a morte em massa de animais.

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Crescimento descontrolado de microrganismos em ecossistemas de água doce, como o Lago Erie ( esquerda ), estão aumentando à medida que o dióxido de carbono, as temperaturas e o escoamento de nutrientes aumentam. Incêndios florestais como os do Pantanal do Brasil ( à direita ) podem piorar o problema. Crédito: Andy Morrison, The Blade, AP / Reprodução: Scientific American

Os autores concluem que comparações com registros globais de tempo indicam que eventos de crescimento microbianos descontrolados são estressores ecológicos persistentes de água doce durante eventos de extinção causados ​​pelo aquecimento. Eles enfatizam ainda que as atuais condições de aquecimento global e alta quantidade de CO2 liberada podem nos levar a eventos de alta proliferação microbiana, como já foi observado no lago Erie, e apontam o estudo como um alerta para os danos do aquecimento global.

 

Colaboração: Iasmin Cartaxo Taveira sobre a autora

Iasmin Taveira queria ser cientista desde criança e acredita que tornar o conhecimento acessível é o melhor jeito de promover desenvolvimento social. É Biotecnologista pela UFPB, mestre e doutoranda em bioquímica na FMRP/USP.

 

Fontes:

Artigo científico intitulado “Lethal microbial blooms delayed freshwater ecosystem recovery following the end-Permian extinction”, publicado na revista  Nature communications em 2021, de autoria de Mays e colaboradores. https://www.nature.com/articles/s41467-021-25711-3

Matéria no site Scientific American, intitulada “Toxic Slime Contributed to Earth’s Worst Mass Extinction—And It’s Making a Comeback. https://www.scientificamerican.com/article/toxic-slime-contributed-to-earth-rsquo-s-worst-mass-extinction-mdash-and-it-rsquo-s-making-a-comeback/

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