#Farol de Notícias (Atualidades científicas que foram destaque na semana)
Pesquisadores desenvolvem uma metodologia que permite produzir madeira de maneira sustentável e com pouco desperdício.
Num cenário mundial onde o planeta perde anualmente cerca de 10 milhões de hectares de floresta – uma área do tamanho da Islândia – por causa do desmatamento, encontrar alternativas para suprir o mercado sem gerar maiores danos ecológicos. Sendo assim, pesquisadores do MIT (Massachusetts Institute of Technology) foram pioneiros em uma técnica capaz de gerar material vegetal in vitro semelhante à madeira. A técnica permite a produção de madeira sem a necessidade de colher ou processar plantas inteiras, permitindo assim: produção localizada de alta densidade, eliminação de coleta e transporte intensivos em energia, processamento reduzido e resiliência climática inerente.
A metodologia desenvolvida pelos pesquisadores permite alterar a rigidez e densidade do material vegetal, e também é possível produzir a madeira em diferentes formas. A pesquisa foi publicada na revista Materials Today em abril de 2022.
Os pesquisadores iniciaram seu trabalho cultivando em meio líquido por dois dias células das folhas de uma planta chamada Zinnia elegans. Após isso, o cultivo foi transferido para um meio a base de gel, contendo nutrientes e hormônios diferentes. A princípio os autores observaram que as características físicas e mecânicas das células vegetais nesse meio poderiam ser reguladas de acordo com alterações de níveis hormonais. Assim, as diferentes concentrações poderiam modificar a rigidez e densidade do produto final.
Em entrevista, Beckwith, principal autora do trabalho, explica que: “No corpo humano, você tem hormônios que determinam como suas células se desenvolvem e como surgem certas características. Da mesma forma, alterando as concentrações hormonais no caldo nutriente, as células vegetais respondem de forma diferente. Apenas manipulando essas pequenas quantidades químicas, podemos provocar mudanças bastante dramáticas em termos de resultados físicos”. Velásquez-García, orientador do trabalho, acrescenta que “De certa forma, essas células vegetais em crescimento se comportam quase como células-tronco – os pesquisadores podem dar pistas para dizer-lhes o que se tornar”.
O segundo passo do trabalho foi moldar as formas do produto final. Para gerar formas específicas do material final, foi usada uma impressora 3D que moldou as células. Esse molde foi feito em placas de Petri que foram incubadas no escuro por três meses. Após a incubação, o material resultante foi desidratado e suas propriedades foram avaliadas. Apesar desse aparentemente longo período de incubação, a produção desse material é duas vezes mais rápida que o processo natural de crescimento de uma árvore até a maturidade. Isso é atribuído à taxa de crescimento e desenvolvimento celular da cultura in vitro.
Os resultados do trabalho mostraram que níveis mais baixos de hormônios produzem células mais arredondadas e, portanto, menos densas. Já os níveis mais altos de hormônios geraram materiais vegetais com estruturas celulares menores e mais densas. Além disso, esses níveis elevados de hormônios aumentaram a taxa de um processo chamado de lignificação, o que levaria a material vegetal com mais propriedades semelhantes à madeira. A lignina é um polímero que se deposita nas paredes celulares das plantas o que as torna rígidas e lenhosas naturalmente.
Com a técnica de bioimpressão de madeira, os pesquisadores conseguem desenvolver diferentes formas e tamanhos do produto, com a rigidez desejada. “Acho que a verdadeira oportunidade aqui é ser ideal com o que você usa e como você o usa. Se você deseja criar um objeto que servirá a algum propósito, há expectativas mecânicas a serem consideradas. Este processo é realmente passível de customização”, diz Velásquez-García.
Além de ter um potencial enorme para evitar o desmatamento, a técnica de bioimpressão de madeira não gera resíduos. Assim, a sustentabilidade do processo de fabricação de móveis usando essa tecnologia é melhor que a fabricação tradicional, responsável por desperdiçar quase 30% de toda a quantidade de madeira produzida.
O grupo tem perspectivas otimistas em relação ao seu trabalho. Seu próximo passo é experimentar diferentes abordagens para que possam entender e controlar melhor o desenvolvimento celular, além de explorar como outros fatores químicos e genéticos podem direcionar o crescimento das células. Os autores também esperam avaliar como seu método pode ser transferido para uma nova espécie e explicam que é preciso adaptação para cada espécie de célula vegetal. Por fim, eles têm a ambição de motivar outros grupos nessa área para ajudar a reduzir o desmatamento.
Colaboração: Iasmin Cartaxo Taveira sobre a autora
Iasmin Taveira queria ser cientista desde criança e acredita que tornar o conhecimento acessível é o melhor jeito de promover desenvolvimento social. É Biotecnologista pela UFPB, mestre e doutoranda em bioquímica na FMRP/USP.
Fontes e mais informações sobre o tema:
Artigo científico intitulado “Physical, mechanical, and microstructural characterization of novel, 3D-printed, tunable, lab-grown plant materials generated from Zinnia elegans cell cultures”, publicado na revista Materials Today em 2022, de autoria de Beckwith e colaboradores.https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S1369702122000451?via%3Dihub#f0010
Matéria no site MIT News, intitulada “Toward customizable timber, grown in a lab”, publicada em 25/05/2022. https://news.mit.edu/2022/lab-timber-wood-0525
Matéria no site SoCientifica, intitulada “Cientistas conseguem cultivar madeira em lab sem cortar uma única árvore”, publicada em 31/05/2022. https://socientifica.com.br/cultivar-madeira-em-laboratorio/