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Como é ser mãe e pesquisadora?

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Maternidade na Ciência: Tive um filho no doutorado e agora?

Ainda no mês das mães, a Ilha do Conhecimento conta com o relato de experiência da Dra Thaís Farnesi, sobre como é ser mãe e pesquisadora. Ademais, a colaboradora Thaís, traz pontos importantes que tornam esse processo o melhor possível.

DESTAQUES:
– Desafios da maternidade na vida profissional de uma cientista;
– Movimento Parent in Science leva a mudanças concretas no cenário científico brasileiro;
– Currículo Lattes inclui campo para preenchimento de licença maternidade.

‘Maternar’ não é o ato apenas de gerar uma vida, mas também de formar seres humanos empáticos às pessoas e aos acontecimentos ao seu redor. Requer amor, dedicação e tempo. Tudo é novo, desafiador. Saber lidar com as situações que se apresentam no dia-a-dia nem sempre é tranquilo e simples. É preciso muito jogo de cintura e uma pitada de intuição. 

A maternidade é um acontecimento transformador na vida de uma família, e mais ainda na vida de uma mulher. E se essa mulher tem múltiplas funções, pode tornar ainda mais desafiador.

A vida acadêmico-científica, que tem por objetivo formar professores para a educação superior e pesquisadores, através dos cursos de mestrado e doutorado, respectivamente, apresenta-se como um caminho longo e árduo, onde as escolhas são necessárias para se atingir a maioria dos objetivos tão esperados e sonhados. É uma área que demanda horas e horas de estudos e pesquisas para a construção e enriquecimento curricular contínuo, já que o currículo tem um peso considerável na aprovação em editais de concursos públicos para o cargo de professor/pesquisador e para a obtenção de financiamento de projetos junto aos órgãos de fomento (agências que financiam as pesquisas, que fornecem suporte financeiro de forma regulamentada para que as pesquisas sejam executadas). Por ser uma área predominantemente masculina, as disparidades entre os gêneros, especialmente quanto à construção do currículo, podem ser sentidas quando as mulheres resolvem se tornar mãe, uma vez que uma lacuna temporal é aberta, isso devido ao período da licença maternidade, além da redução considerável no tempo disponível para a dedicação a carreira.

Diferentemente da grande maioria das mulheres que ingressam na vida científica, e por já ter minha vida pessoal sólida e estabelecida, eu decidi que já era a hora de me tornar mãe, afinal já estava na ‘casa dos 30 e poucos’ e ser mãe de primeira viagem aos 40 não estava nos meus planos (a preocupação com ‘tal do relógio biológico’). Foram alguns meses de ponderações até a decisão final, pois não havia atingido todos os meus objetivos profissionais. O que para muitos e muitas da minha área poderia ser uma ‘loucura’, para mim e minha família era o momento ideal. Foi quando, em 2015 com 32 anos, nasceu meu filho Nícolas, quando eu ainda estava cursando o doutorado. 

Fácil?! Com todas as letras “não foi!”. Ainda, nesta época, me encontrava como professora substituta junto à disciplina de Parasitologia da Universidade Federal do Triângulo Mineiro – UFTM, em Uberaba-MG. Logo após a licença maternidade, retornar a rotina de pesquisa, estudos e reassumir as aulas da disciplina, exigiram muita organização e a colaboração de uma boa rede de apoio. 

Equilibrar as funções de ser mãe, dona de casa, esposa e pesquisadora é muitas vezes um verdadeiro malabarismo. Mas poder contar com uma rede de apoio, encarar as coisas com objetividade e estar ciente de que não se dá conta de tudo o tempo todo, foram essenciais para poder concluir meu doutorado, e ainda são, para permitir que eu siga na vida acadêmica em busca dos meus objetivos profissionais. 

Hoje, meu filho tem 7 anos e eu trabalho como pesquisadora a nível de pós-doutorado no Laboratório de Imunologia da UFTM, o qual ingressei em meados de 2020, início da então pandemia da COVID-19. No contexto atual, assim como anteriormente, ser mãe-pesquisadora, possui uma dinâmica única, onde é preciso equilibrar e ajustar os pesos na balança de modo que nenhuma das partes seja completamente prejudicada e, não menos importante, para que a autocobrança não afete o nosso bem-estar psicológico e emocional. 

Assim como as demais profissões, as mães-pesquisadoras tiveram a vida profissional afetada pelo período pandêmico da COVID-19, especialmente para as que precisaram, além de todas as funções já desempenhadas, acompanhar os filhos nas aulas on-line durante o isolamento social. Com isso, as demandas da pesquisa necessitaram ser remanejadas de acordo com a rotina da criança junto  à escola. O meu maior desafio, nestes últimos anos, foi conciliar as aulas online (de criança em processo de alfabetização) com a produtividade no trabalho. Atualmente, o retorno presencial das instituições de ensino, possibilitou a minha maior produtividade com a produção de capítulos de livros, alguns artigos em colaboração, a orientação de alunos em diferentes níveis acadêmicos e a contribuição com outros grupos de pesquisa vinculados ao laboratório ao qual estou filiada. Dedicar tempo de qualidade com meu filho nas horas vagas é uma das minhas prioridades, o trabalho é desenvolvido em horários específicos de modo que não afete a percepção do meu filho frente ao que significa ser pesquisador e a carreira acadêmica.

Vale ressaltar que neste contexto, de mulheres que atuam como pesquisadoras, surgiu, no Brasil, em 2016, um movimento chamado Parent in Science (https://www.parentinscience.com/, também com pagina no Twitter e Instagram), criado por uma mãe-pesquisadora, engajada em promover um ambiente mais justo na academia. O movimento levou para diferentes cidades do Brasil a discussão sobre a maternidade na carreira científica, e além disso, objetiva compreender o impacto dos filhos na carreira científica de mulheres (e homens). 

Devido a sua grande repercussão, hoje graças ao movimento do grupo e seus apoiadores, o Currículo Lattes (plataforma eletrônica de currículo que avalia/pontua a produtividade de cientistas brasileiros), desde abril/2021, permite a inserção do período de licença maternidade, além de ter conseguido com que diferentes editais de financiamento considerem os períodos de licença-maternidade na análise curricular, havendo sistemas de pontuações compensatórios. 

O grande segredo para tudo na vida é o equilíbrio, encontre a ponderação que te faça feliz e siga. Não pare, apenas caminhe, que os resultados aparecem.

 

Sobre a entrevistada: Thaís Soares Farnesi de Assunção

Links: lattes, e-mail

mãe pesquisadoraBiomédica pela Universidade de Uberaba, Mestra em Ciências Fisiológicas (Área de Concentração: Parasitologia, Imunologia e Microbiologia) e Doutora em Ciências (Parasitologia e Imunologia Aplicadas), pelo Programa de Pós-Graduação em Ciências Fisiológicas e Medicina Tropical e Infectologia, respectivamente, ambos da Universidade Federal do Triângulo Mineiro – UFTM. Atualmente é pesquisadora à nível de pós-doutorado, trabalhando nas áreas de Imunologia e Doenças Infecciosas (COVID-19, Leishmaniose e Doença de Chagas).

 

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