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Vesículas extracelulares: pequeno tamanho, grande potencial

#Ciência et al. (Especiais temáticos repletos de informações científicas)

Conheça as vesículas extracelulares e seu potencial para aplicações na área da saúde

Destaques:
– Vesículas extracelulares são produzidas por praticamente todos os tipos celulares e diversos organismos unicelulares;
– Estão envolvidas em diversos processos do organismo, garantindo a sobrevivência, assim como na interação com outros organismos;
– Podem ajudar a entender o funcionamento de doenças e permitem o desenvolvimento de novas vacinas, medicamentos e terapias.

“Vesículas extracelulares” é um termo que descreve estruturas muito pequenas (geralmente medidas em nanômetros), formadas por uma camada dupla composta de lipídeos e proteínas, e repletas de moléculas em seu interior. Elas são produzidas e liberadas por muitos, se não todos, os tipos celulares, além de muitos organismos unicelulares, podendo ser encontradas em bactérias, fungos, humanos e plantas, por exemplo. Isso sugere que esse processo se conservou durante a evolução e, portanto, representa um mecanismo importante para a sobrevivência dos organismos. Inicialmente, a secreção dessas vesículas extracelulares (VEs) foi descrita como um meio de eliminar compostos desnecessários produzidos pelas células, mas hoje sabemos que as VEs não são carregadoras de lixo, pois elas permitem a troca de diversos componentes entre células, mediando comunicações de alta complexidade, agindo na regulação de eventos fisiológicos e de resposta a condições ambientais específicas, estando envolvidas em processos normais ou patológicos.

O termo VEs se refere a todos os diversos tipos de vesículas de membranas secretadas, mas elas podem ser nomeadas de forma diferente, com base no seu tamanho, síntese ou localização. Geralmente, a classificação é feita entre microvesículas, com 50 a 1000 nm, produzidas a partir do brotamento da membrana plasmática; e exossomos, com 30 a 100 nm, produzidos na região interior da célula e liberados pela fusão com a membrana plasmática. Autores também indicam uma terceira divisão, os corpos apoptóticos, com 500 a 2000 nm, que são vesículas liberadas ao exterior pela fragmentação celular ocorrida durante o processo de morte celular, a apoptose. 

As VEs podem carregar diversos componentes importantes, como proteínas, lipídeos, ácidos nucleicos, pigmentos e metabólitos secundários, moléculas indispensáveis para a sobrevivência e o crescimento dos organismos. Esse conteúdo pode variar em tipo e quantidade, dependendo do tipo de célula que o produz e das condições do ambiente em que o organismo se encontra, fato que também determinará o destino e a função das VEs. Devido à falta de homogeneidade, é difícil indicar a origem das VEs e a maioria dos estudos foca em entender sua composição e funções.

Após serem liberadas no exterior da célula de origem, as VEs podem alterar o ambiente em que se encontram e alcançar outras células. Para que sejam captadas, devem encaixar na membrana da célula-alvo e ativar os seus receptores de superfície para iniciar o processo de internalização ou fusão, entregando seu conteúdo. Essa interação com a superfície celular ainda não é completamente entendida, por ser complexa e depender de diversos fatores, porém a entrega dessas moléculas irá desencadear respostas e processos celulares, promovendo alterações que afetarão o organismo de forma positiva ou negativa. Por exemplo, microvesículas geradas e liberadas por células-tronco embrionárias podem interagir com o tecido materno e sinalizar às células que promovem a implantação embrionária, permitindo o desenvolvimento da gravidez.

VEs estão frequentemente relacionadas à diversos processos fisiológicos normais do organismo, mas também são relacionadas à interações com outras células ou organismos. Em fungos, as VEs foram identificadas em mais de vinte espécies diferentes, desde sua primeira descrição em 2007, incluindo as leveduras e os fungos filamentosos. A sua relevância abrange a interação entre células no nível de comunidade, em diferentes estágios do ciclo de vida dos fungos e mesmo na transferência de moléculas associadas à virulência de uma cepa para outra. As VEs produzidas nos biofilmes de Candida albicans, por exemplo, são diferentes daquelas produzidas por culturas de células livres, e a sua liberação é uma característica importante para a formação adequada do biofilme, permitindo a resistência a medicamentos, que pode oferecer uma vantagem à sobrevivência do fungo. 

Além disso, a interação fúngica com outros organismos (hospedeiros, como uma planta ou um mamífero) também é influenciada pela presença de VEs. Demonstrou-se, por exemplo, que VEs produzidas por Aspergillus flavus induzem a produção de moléculas que estimulam inflamações, aumentam a capacidade dos macrófagos (células de defesa do corpo) em eliminar o fungo e reduzem a quantidade de fungos existentes em modelos de infecção. Esses resultados indicam que as VEs de A. flavus podem preparar o sistema imunológico inato do hospedeiro para eliminar a infecção fúngica. 

uso de vesículas para imunologia e saúde
Vesículas fúngicas podem ser alvos de novos agentes antifúngicos, bem como potenciais candidatos a medicamentos quimioterápicos e auxiliar no desenvolvimento de vacinas. Imagem: adaptada de Freitas, M., 2019.

 

A diversidade dessas moléculas presentes nas VEs resulta em uma resposta imune diversa. Em alguns casos, as interações entre as VEs e o sistema imunológico são benéficas para o hospedeiro e, em outras situações, as vesículas favorecem o desenvolvimento da doença. Nem todas as interações que envolvem VEs estão bem descritas, mas, de fato, VEs fúngicas são fatores importantes na modulação da resposta imune e agem em diferentes níveis, dependendo do patógeno e da quantidade de vesículas, tendo grande potencial no desenvolvimento de novas estratégias para combater infecções fúngicas.

Atualmente, durante a pandemia de COVID-19, estudos sugerem que exossomos derivados de células infectadas podem contribuir para promover a entrada de vírus em outras células, promovendo suscetibilidade à infecção pelo vírus através do conteúdo entregue às células receptoras. Também foi identificado que infecções por coronavírus aumentam exossomos circulantes, e estes contêm partículas virais, sugerindo um papel de apoio à disseminação da infecção viral. Entretanto, exossomos de células infectadas podem induzir a resposta imune humoral do hospedeiro e são importantes para identificar mecanismos moleculares envolvidos na disseminação do vírus e abrir novas possibilidades para o tratamento eficiente.

VEs também são relacionadas a infecções bacterianas e câncer, portanto é sugerido que VEs são fatores úteis para o entendimento de diferentes doenças e o desenvolvimento de medicamentos, terapias e vacinas, sendo consideradas um importante alvo para estudos.

Colaboração: André Moreira Pessoni sobre o autor

Fontes consultadas:

– Artigo científico intitulado “Extracellular vesicles for drug delivery”, publicado na revista Advanced Drug Delivery Reviews em 2016, de autoria de Vader, P.  e colaboradores.

– Artigo científico intitulado “Extracellular Vesicles from Aspergillus flavus Induce M1 Polarization In Vitro”, publicado na revista mSphere em2020, de autoria de Brauer, V. e colaboradores.

– Artigo científico intitulado “Extracellular Vesicles in Fungi: Past, Present, and Future Perspectives”, publicado na revista Frontiers in Cellular and Infection Microbiology em 2020, de autoria de Rizzo, J. e colaboradores.

– Artigo científico intitulado “Fungal Extracellular Vesicles as Potential Targets for Immune Interventions”, publicado na revista mSphere em 2019, de autoria de Freitas, M. e colaboradores.

– Artigo científico intitulado “Media matters! Alterations in the loading and release of Histoplasma capsulatum extracellular vesicles in response to different nutritional milieus”, publicado na revista Cellular Microbiology em 2020, de autoria de Cleare, L. e colaboradores.

– Artigo científico intitulado “Shedding light on the cell biology of extracellular vesicles”, publicado na revista Nature Reviews em 2018, de autoria de van Niel, G.; D’Angelo, G.; e Raposo, G.

– Artigo científico intitulado “The role of extracellular vesicles in COVID-19 virus infection”, publicado na revista Infection, Genetics and Evolution em 2020, de autoria de Hassanpoura, M. e colaboradores.

(Editoração: Fernando Mecca, Beatriz Spinelli e Caio Oliveira)

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