Mutação envolvida com a função muscular explica adaptação a baixas temperaturas.
A proteína α-actinina-3 está ausente em cerca de 1,5 bilhões de pessoas no mundo. Essa deficiência afeta a função muscular, sem causar doenças, tanto na população geral quanto em atletas. Assim, um estudo que relacionou as implicações evolutivas dessa mutação observou sua abundância em humanos que migraram da África para os climas mais frios da Europa central e do norte. Com base nessa evidência, o artigo publicado na revista The American Journal of Human Genetics em março de 2021 mostrou que esta mutação está de fato envolvida com uma maior resistência ao frio.
A pesquisa envolveu análises em humanos (jovens do sexo masculino) e em modelos animais. Os humanos na pesquisa passaram por uma genotipagem, que é uma análise determinante das diferenças genéticas entre indivíduos, e foram separados em grupos de acordo com a deficiência da proteína ou não. Para analisar o envolvimento desta proteína com a tolerância ao frio, os voluntários foram submetidos a imersão em água gelada (14ºC) e a sua habilidade em manter a temperatura foi analisada. Foi observado que 69% dos indivíduos foram capazes de manter a sua temperatura no grupo de indivíduos deficientes para produção da α-actinina-3, enquanto apenas 30% do grupo que possuía a α-actinina-3 funcional teve resultado semelhante.
Os modelos animais utilizados foram ratos com o gene α-actinina-3 deletado e ratos expressando esse gene. Esses animais passaram por um protocolo de exposição ao frio, assim como os humanos, e foi observada uma diferença na expressão de genes envolvidos na termogênese, indicando que aqueles ratos deficientes para expressão da proteína teriam maior atividade termogênica. Isso significa que ratos com deficiência na expressão da α-actinina-3 são mais eficientes em manter sua temperatura e, portanto, têm maior resistência ao frio.
Há fibras musculares de contração rápida e lenta, essas fibras têm uma expressão diferencial das proteínas SERCA e CSQ, que possuem diferentes isoformas (diferentes formas que uma proteína pode adquirir) presentes em fibras específicas. Essas proteínas são conhecidas por regular a termogênese nos músculos. Partindo desta informação, os pesquisadores observaram que animais que não expressavam a proteína α-actinina-3, possuíam um conjunto de genes expressos que estavam relacionados a uma maior termogênese, logo, esses indivíduos têm uma maior tolerância ao frio justamente devido à presença de fibras de contração lenta.
A mesma explicação para uma maior resistência ao frio explica também a capacidade atlética diferenciada de atletas de alta performance. A ausência dessa proteína diminui a habilidade para execução de atividades de explosões poderosas de energia e recuperação muscular. Observa-se que o percentual de fibras de contração rápida e lenta está relacionada à aptidão do atleta para cada esporte.
Esse estudo apresenta um mecanismo fisiológico de proteção contra o frio com eficiência energética em indivíduos deficiente de α-actinina-3. Os autores concluíram que humanos com essa mutação exibem maior tolerância ao frio e uma geração de calor energeticamente eficaz, devido à presença de fibras de contração lenta. No entanto, o ganho de resistência ao frio é em detrimento a uma menor habilidade em atividades que requerem explosões energéticas.
News: Iasmin Taveira
Fontes e mais informações sobre o tema:
Artigo científico intitulado “Loss α-actinin-3 during human evolution provides superior cold resilienceand muscle heat generation”, publicado na revista The American Journal of Human Genetics em 2021, de autoria de Wyckelsma e colaboradores.
https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0002929721000136
Matéria no site BBC Brasil, intitulada “Mutação genética explica por que uns aguentam mais frio intenso que outros”, publicada em 16/05 /2021.
https://www.bbc.com/portuguese/vert-fut-56642185
(Editoração: André Pessoni)