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DNA E LOCAIS DE CRIME

 #Ciência et al. (Conteúdos repletos de informações científicas) 

Como o DNA pode auxiliar na perícia criminal?

DESTAQUES:
• Diferentes vestígios biológicos podem ser obtidos em cenas de crime, como sangue, sêmen e cabelos, podendo facilitar a investigação criminal;
• A obtenção de DNA dos vestígios biológicos encontrados podem permitir a identificação de suspeitos, vítimas e pessoas desaparecidas;
• Graças aos polimorfismos que permitem a individualização de seres humanos e às diferentes técnicas moleculares de análise de DNA, a perícia criminal possui uma ferramenta aliada valiosíssima na identificação de pessoas desaparecidas, não identificadas e na solução de crimes contra a pessoa.

QUAIS OS VESTÍGIOS BIOLÓGICOS NA PERÍCIA CRIMINAL?

Diferentes tecidos e fluidos biológicos encontrados em locais de crime como sangue, saliva, cabelo, ossos, dentes, líquidos corporais diversos e tecidos mesmo mumificados, podem ser fontes de DNA (ácido desoxirribonucleico), mesmo quando encontrados em pouquíssimas quantidades.

Para que possam ser utilizados, quem coleta, normalmente o perito criminal, deve coletar de maneira adequada, armazenando as amostras de acordo com os critérios para cada tipo de material biológico encontrado.

A fita dupla de DNA pode ser encontrada nos núcleos das células (DNA genômico), sendo esse o mais comum no cotidiano da perícia forense, e nas mitocôndrias, encontrado nos cabelos, dentes e ossos, e utilizando em circunstâncias específicas, quando o DNA do núcleo das células não pode ser analisado, como por exemplo em casos de explosões e incêndios.

dna celular e mitocondrial
Figura 1. Esquemas da localização do: a. DNA celular/genômico. b. DNA mitocondrial. Fonte: https://brasilescola.uol.com.br/

A molécula de DNA é considerada o melhor material para a identificação de pessoas, por armazenar o perfil genético, que é considerado único, de cada indivíduo. Essa molécula possui regiões chamadas codificadoras, chamadas éxons, e não codificadoras, chamadas íntrons. Nessas últimas são encontrados os chamados marcadores genéticos polimórficos (conhecidos mais corriqueiramente como polimorfismos), que são as partes do DNA utilizadas para a identificação de cada indivíduo em específico, já que são regiões que o perfil genético varia entre as pessoas podendo, quando em conjunto de marcadores, distinguir todas as pessoas do mundo, como exceção dos gêmeos monozigóticos.

São 13 os conjuntos de marcadores utilizados pela perícia criminal para distinguir os indivíduos de uma população, além do marcador AMEL para identificação do sexo biológico.

dna marcadores forenses
Figura 2. Marcadores genéticos polimórficos para identificação em perícia criminal. Adaptado de https://bioclimate.commons.gc.cuny.edu/analyzing-dna/variable-number-tandem-repeats/

O DNA pode ser obtido dos seguintes vestígios biológicos:

dna tabela

 

COMO É OBTIDO O DNA DOS VESTÍGIOS BIOLÓGICOS?

Para se obter o DNA dos vestígios biológicos são utilizadas diferentes técnicas, de acordo com o vestígio encontrado. Todas elas se baseiam em romper a membrana das células (processo chamado de lise celular) e separar o DNA das demais partes celulares, como proteínas, lipídeos e RNA, utilizando-se solventes e substâncias que fazem as partes se separaram devido aos diferentes pesos entre as mesmas, além de ser necessário retirar os contaminantes do local de crime em que foi coletado.

 

COMO O DNA É ANALISADO?

Reação em Cadeia da Polimerase (PCR – Polymerase Chain Reaction

Após serem realizadas sucessivas etapas de resfriamento e aquecimento da amostra de DNA de interesse (os mesmos marcadores genéticos polimórficos), a região de interesse do DNA de fita simples é separada e amplificada (síntese de novas fitas de DNA) para poder ser observada em análises futuras;

É uma técnica muito sensível e específica que permite obter material de amostras já degradadas ou presentes em pouca quantidade, permitindo o confronto genético (comparação entre amostras) de material de suspeitos (e também vítimas) e do material encontrado na cena de crime;

Existem kits já prontos que permitem o estudo dos principais marcadores polimórficos utilizados atualmente na genética forense e identificação criminal.

dna pcr
Figura 3. Esquema simplificado do processo feito pelo PCR. Adaptado de https://pt.khanacademy.org/science/ap-biology/gene-expression-and-regulation/biotechnology/a/polymerase-chain-reaction-pcr

 

Reação em Cadeia da Polimerase em Tempo Real (RT-PCR) 

Técnica semelhante ao PCR, porém com análise feita a partir da emissão de fluorescência das regiões polimórficas de interesse, permitindo uma análise ainda mais acurada e específica, além de possuir kits específicos para DNA humano.

 

Polimorfismo de comprimento de fragmentos de restrição (RFLP – Restriction Fragment Length Polymorphism

dna rflp
Figura 4. Esquema simplificado do processo feito pelo RFLP. Adaptado de https://www.researchgate.net/profile/Esther-Lantero/publication/320395510

Técnica que utilizam enzimas, chamadas enzimas de restrição, que cortam o DNA em regiões específicas, gerando fragmentos de diferentes tamanhos de DNA;

Cada pessoa apresenta um padrão, em quantidades e tamanhos de fragmentos que variam entre os indivíduos, o que permite a identificação individualizada de cada pessoa;

Esse perfil pode ser visualizado a partir de uma corrida de eletroforese, técnica que permite, através da geração de um campo eletromagnético, o deslocamento dos fragmentos de DNA obtidos em um gel denso, semelhante a uma gelatina. De acordo com seu tamanho, deslocando os mais leves de forma mais rápida e os mais pesados de forma mais lenta, ficando os leves nas partes mais baixas do gel e os maiores nas partes mais altas. Os fragmentos presentes em maior quantidade se acumulam em uma mesma altura, aparecendo em bandas mais escuras do que os que se apresentam em menor quantidade;

É uma técnica mais prática, rápida e de grande custo-benefício em relação ao PCR.

 

Polimorfismo de um único nucleotídeo (SNPs – Single nucleotide polymorphisms) (veja em outro texto do nosso site http://ilhadoconhecimento.com.br/dna_saude_variacoes_geneticas/)

Técnica que pode ser utilizada em amostras de DNA muito degradadas, já que analisa fragmentos muito menores e polimorfismo de apenas um nucleotídeo;

Como essas regiões podem alterar a expressão dos genes, elas permitem a fenotipagem do indivíduo, permitindo definir suas características físicas, como cor da pele, olhos, cabelos, forma da face entre outras, permitindo assim um direcionamento do retrato falado de suspeitos e também pessoas desaparecidas;

Porém, para ter o perfil genético de uma pessoa é necessária uma grande quantidade de SNPs identificados.

DNA SNPS
Figura 5. Esquema simplificado da análise a partir das SNPs. Acervo próprio.

 

Sequenciamento de nova geração 

Técnica que permite a análise simultânea de milhões de fragmento de DNA, permitindo a detecção de uma grande quantidade de polimorfismos genéticos;

Quando automatizada, permite a análise de uma grande quantidade de dados em um tempo rápido, necessário quando se busca o suspeito de um crime ou mesmo identificar vítimas em desastres em massa.

 

BANCO DE DADOS DE DNA

A partir da obtenção do perfil genético das amostras pelas técnicas acima, puderam ser criados os primeiros bancos de dados de DNA na década de 1990.

No Brasil, essa criação foi regulamentada apenas em 2012, pela Lei n°12.564, que permitiu a criação de um banco de dados, utilizando o sistema CODIS (Combined DNA Index System, traduzido livremente como Sistema de catalogação comparada de DNA) para arquivar perfis genéticos de pessoas condenadas por crimes dolosos ou hediondos, amostras questionadas em caso de crimes contra a pessoa e de violência sexual, cadáveres não identificados, familiares de pessoas desaparecidas, sendo os dados armazenados de forma sigilosa e gerenciado por uma unidade oficial de perícia criminal. Esse sistema permite buscar e obter informações que possam auxiliar nas investigações criminais.

Assim, o poder de individualização de cada indivíduo devido ao seu perfil genético obtido a partir de seu DNA é uma ferramenta atualmente imprescindível para a perícia criminal, identificando as pessoas envolvidas e vinculando suspeitas nas cenas de crime, levando à resolução de casos. Tudo isso se deve ao desenvolvimento de técnicas moleculares e sobretudo, a valorização da ciência.

 

Colaboração:

Nathália Amato Khaled sobre a autora

Nathália é perita criminal, professora, doutora em genômica e bioinformática, mestre em imunologia e graduada em Biomedicina. Fascinada pela área forense desde os 11 anos de idade, atua na mesma e vê na educação, aliada à ciência, as possibilidades de mudanças significativas para a sociedade. Nathália também é responsável pelo desenvolvimento do website e gestão de conteúdo no Ilha do Conhecimento.

 

Referências:

Artigo científico intitulado “Análise de DNA em odontologia forense”, publicado na revista Arquivo brasileiro de Odontologia em 2010, de autoria de De Souza Vieira, G.; Tavares, C.A.P. e Bouchardet, F.C.H.

Artigo científico intitulado “DNA forense e a coleta de vestígios em locais de crime”, publicado na revista Especialize On-line IPOG em 2017, de autoria de Célia, A.

Artigo científico intitulado “Genotipagem de DNA em condições adversas de amostras low copy number – LCN: amostras de tecidos formolizados e emblocados em parafina”, publicado na revista Prova Material em 2009, de autoria de Nascimento, E.; Pinheiro, M.C. e Souza, G.N.P.

Artigo científico intitulado “Uso das técnicas de biologia molecular na genética forense”, publicado na revista Derecho y Cambio Social em 2013, de autoria de Da Silva Leite, V. e colaboradores.

Livro “Criminalística”, de autoria de Stumvoll, V.P., publicado pela Millennium Editora. São Paulo em 2014. 6a ed.

Livro “Introdução à Biologia Forense”, de autoria de Dias Filho, C.R.; Francez, P.A.C., publicado pela editora Millennium Editora. São Paulo em 2016. 1a ed.

 

(Editoração: Bruna L. Ferreira)

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