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Príons podem afetar o sistema nervoso, causando doenças priônicas de difícil reconhecimento pelo sistema imune, sendo assim consideradas incuráveis
DESTAQUES: • “Príon” vem da junção das palavras “proteinaceous” e “infection”, ou seja, são proteínas infectantes; • O pesquisador Stanley Prusiner, ganhador do Prêmio Nobel, destaca que as proteínas priônicas podem ser adquiridas pelo contato com tecidos contaminados e pela hereditariedade; • As doenças priônicas são conhecidas como “Encefalopatias Espongiformes Transmissíveis”, pois causam deterioração do cérebro, formando vários poros, similar a uma esponja. |
Quando pensamos em doenças infecciosas, logo associamos com vírus, bactérias, fungos, entre outros seres vivos. Mas nem sempre é assim: existem moléculas que também infectam animais, inclusive os seres humanos. Um exemplo são os príons.
O termo “príons” vem da junção das palavras em inglês “proteinaceous” e “infection”, ou seja, infecção proteica (livre tradução). As proteínas priônicas, presentes nas células do sistema nervoso – os neurônios -, nem sempre causam doenças. Para elas serem patogênicas devem estar em uma conformação errada, isto é, estruturadas de forma anormal. É importante destacar que as proteínas sofrem certas “dobraduras” a depender das suas características químicas. A partir de estímulos ainda não compreendidos, uma proteína pode ganhar uma forma que altera sua função na célula.
Embora os príons estejam presentes em células importantes para nossa sobrevivência (neurônios), eles não ativam nosso sistema de defesa: o sistema imune. Dessa forma, os príons não são reconhecidos e combatidos pelo nosso corpo. Além disso, os príons são resistentes à esterilização: usar álcool em gel ou lavar as mãos com água e sabão não nos protege contra os príons.
Além disso, os príons tem uma intensa capacidade de se replicar: quando um proteína priônica normal entra em contato com um príon anormal, essa proteína normal muda sua estrutura para a forma incorreta.
Apesar dessa capacidade de replicação, os príons não são considerados seres vivos, pois não possuem material genético (DNA ou RNA) nem célula; e não precisam se alimentar para produzir energia, já que não têm o mesmo metabolismo.
Mas, com todas essas características de difícil reconhecimento, como os príons foram descobertos?
Com observações e evidências! No século XVIII, na Grã-Bretanha, os criadores de animais cruzavam animais irmãos a fim de gerar filhotes com características mais fortes ou economicamente viáveis. Por exemplo, os cruzamentos eram feitos para que as vacas tivessem carnes mais macias e produzissem mais leite.
Como já é sabido, o cruzamento consanguíneo pode gerar filhotes com doenças genéticas ou com maior predisposição a outras doenças. Observou-se que a prole de alguns desses cruzamentos apresentava comportamentos agressivos, perda de movimento ou movimentos bruscos e agitados, e morria em até um ano.
Em 1957, na Oceania, cientistas observaram que indivíduos da tribo Fore morriam por uma doença conhecida como “Kuru”. Essa doença era marcada pelos mesmos sintomas de movimentos bruscos ou perda de movimento que se observavam nos animais dos cruzamentos consanguíneos. Mas a consanguinidade não era comum entre os membros da tribo Fore; uma característica chamativa sobre eles é que praticavam o canibalismo.
Assim, em 1982, o cientista Stanley Prusiner, motivado a estudar essas evidências, conseguiu purificar o agente infeccioso presente nelas: uma proteína. Sua equipe avançou no estudo desta proteína infecciosa, que agora é o que chamamos de príons. Em seu trabalho, recompensado com um Prêmio Nobel, Prusiner destaca que as proteínas priônicas podem ser adquiridas tanto pelo contato com tecidos contaminados (por ingestão, como visto com os canibais da tribo Fore), quanto pela hereditariedade.
As doenças priônicas são conhecidas como “Encefalopatias Espongiformes Transmissíveis”, dado que o tecido infectado, o cérebro, se deteriora, formando vários poros, similar a uma esponja. A patologia mais estudada no ser humano é a Doença de Creutzfeldt-Jakob, cujos sintomas são similares aos do mal da vaca louca em bovinos (também causado por príons): perda de movimentos, problemas neurológicos, entre outros. Em ambos os casos, não há cura nem tratamento para os indivíduos doentes. Infelizmente, esses morrem em até 1 ano. O diagnóstico se dá por ressonância magnética e eletroencefalograma, além de medir as proteínas presentes no líquido que banha o sistema nervoso (o líquido cefalorraquidiano).
Logo, percebe-se que ainda há escassez nos estudos acerca dos príons. Isso se dá não só pela dificuldade no isolamento e estudo destes, como também pela priorização de outras áreas de conhecimento e interesse científico. Por isso, destaca-se a importância de compartilhar informações sobre o assunto, a fim de incentivar pessoas interessadas.
Colaboração:
Helena de Andrade Barbosa Guilherme
Helena é graduanda no terceiro ano de Ciências Biomédicas pela Universidade de São Paulo. Possui grande interesse na Biologia das Moléculas e no estudo de Genética, áreas na qual realiza também sua iniciação científica.
Esse texto foi produzido por Helena, em colaboração com os colegas: Arthur Martins Machado, Audrey Beatriz Watanabe do Valle Queiroz, Joaquim Garcia de Figueiredo, Letícia Yumi Okada e Lorena de Oliveira Agati.
Referências
Artigo científico intitulado “Novel Proteinaceous Infectious Particles Cause Scrapie”, publicado na revista Science em 1982, de autoria de Prusiner, S.
Livro “Biologia Molecular da Célula”, de Alberts, B.; Johnson, A.; Lewis, J.; e colaboradores, publicado pela editora Artmed em 2017. 6a ed.
Matéria no site InVivo da FioCruz intitulada “Moléculas infecciosas: príons” publicada em 29/11/2021. Disponível em https://www.invivo.fiocruz.br/cienciaetecnologia/moleculas-infecciosas-prions/
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(Editoração: Fernando F. Mecca e Nathália A Khaled)