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O que um astrônomo faz?

Ao imaginar um astrônomo, tenho certeza de que a primeira imagem que vem a sua cabeça é a de alguém olhando por uma luneta. Essa imagem é ultrapassada e bem pouco representativa de todas as funções que um astrônomo pode ter. Por isso, vamos falar um pouco sobre o que é a astronomia e qual o papel do astrônomo.

A astronomia é uma das ciências mais antigas e permitiu relacionar a observação do céu com previsão de eventos, como estações do ano, época de chuvas, de cheias de rios, entre outros. Antes do estabelecimento do método científico, que só ocorreu por volta do século XVII, a astronomia era misturada com filosofia, física e astrologia. Os pensadores astrônomos da época tentavam entender desde como o Universo havia sido criado e qual era o papel do homem nele, até o que eram os astros vistos no céu e como eles influenciavam a vida na Terra. Após a Revolução Científica, em que houve a criação do método científico para separar o que é ciência do que não é, as ciências começaram a se dividir. A astrologia não mais podia ser classificada como ciência e a astronomia começou a ganhar autonomia e rigor científico. Foi durante a Revolução que grandes descobertas e propostas foram feitas. Nicolau Copérnico apresentou o modelo heliocêntrico do Sistema Solar. Johannes Kepler sugeriu que as órbitas dos planetas são em forma de elipse. Galileu adaptou as lunetas para a observação do céu, descobrindo as manchas solares e as luas de Júpiter. Isaac Newton definiu as leis de movimento a partir da gravidade. Tudo isso teve como consequência uma mudança drástica em como vemos o mundo e abriu portas para perguntas muito mais complexas.

Hoje, a astronomia é separada basicamente nas seguintes áreas:

  • Astrobiologia: estuda a presença, formação e evolução de sistemas biológicos no espaço.
  • Astrofísica Estelar: estuda as propriedades das estrelas, assim como sua formação e evolução.
  • Astrofísica Galáctica: estuda as propriedades e estruturas da nossa galáxia, a Via Láctea.
  • Astrofísica Extragaláctica: estuda as propriedades, estruturas e formação de galáxias além da Via Láctea.
  • Astrofísica de Altas Energias: estuda os fenômenos mais energéticos do Universo, como Gamma-ray burst, e emissões de buracos negros.
  • Cosmologia: estuda o início e o fim do Universo, e a sua estrutura em larga escala.
  • Instrumentação: desenvolve equipamentos para permitir o avanço dos estudos da astronomia.
  • Ciência planetária: estuda a formação e as propriedades dos planetas e seus satélites.

Claro que existem muitas subáreas e muitas pesquisas em conjunto com outras áreas, como a ciência espacial, responsável por satélites e foguetes, a arqueoastronomia, que estuda a astronomia de civilizações passadas, a astroquímica, que estuda a evolução química do Universo, mas as principais são essas mesmo.    

E como um astrônomo trabalha? Os telescópios profissionais já não exigem um observador colocando seu olho nele desde a metade do século XIX, em que as placas fotográficas foram inventadas e utilizadas para tirar fotos. Nas últimas décadas, todos os telescópios profissionais utilizam CCD (“charge-coupled device”), que é o mesmo tipo de instrumento presente na sua câmera digital e no seu smartphone, e, com isso, muitas vezes o astrônomo nem precisa estar perto do telescópio para usá-lo. Isso mesmo, hoje, um pesquisador, no Brasil ou em qualquer outro lugar do mundo, pode apontar um telescópio que está no Chile, sem ter que se locomover. Assim fica muito mais fácil porque, ao invés de ter que viajar durante muitas horas, você só precisa de uma conexão de internet. E olha que muitos astrônomos nem precisam usar telescópios em suas pesquisas!

Os pesquisadores que usam dados de telescópios em suas pesquisas, são chamados astrônomos observacionais. Mas também existem os teóricos, que desenvolvem as teorias físicas e matemáticas para explicar os fenômenos. Existem também os astrônomos que desenvolvem e usam programas de computador para fazer simulações e os que trabalham com instrumentação, que normalmente usam laboratórios para desenvolver suas tecnologias.

E onde um astrônomo trabalha? O astrônomo normalmente está ligado a universidades, centros de pesquisa, laboratórios e, claro, observatórios. Assim como todas as ciências de base (aquelas que não têm aplicação imediata), a astronomia é majoritariamente financiada pelo governo. É assim qualquer lugar do mundo. Por isso, para conhecermos melhor o Universo em que vivemos, precisamos muito do apoio do governo.

Essa associação entre a geração de conhecimento científico e as instituições públicas merece destaque, pois no cenário brasileiro atual temos uma sociedade que está cada vez mais distante da ciência, que desacredita os cientistas brasileiros e seus trabalhos, que apoia os cortes na ciência e educação, que não entende o que as universidades produzem e que constantemente é enganada por notícias falsas.

A desvalorização da ciência, principalmente de áreas básicas como a Astronomia, é preocupante pois o conhecimento é o que gera a produção de novas tecnologias, que, por sua vez, são uma fonte importantíssima para mover a economia e trazer lucro para o país. E, ao contrário do que se imagina, a ciência brasileira não fica para trás da ciência mundial no quesito qualidade, mas sim nos quesitos financiamento e valorização. Quantas vezes já não nos deparamos com o pensamento: “Ah, OK. Eu aceito investimento em pesquisas de cura do câncer, mas astronomia é gasto de dinheiro público!”.

Marie Curie, única cientista no mundo a receber dois prêmios Nobel, disse: “Mas não podemos esquecer que, quando o rádio foi descoberto, ninguém sabia que seria útil nos hospitais. Tratava-se de um trabalho de ciência pura. E isto é uma prova de que o trabalho científico não deve ser considerado do ponto de vista da sua utilidade direta. Tem de ser feito por si mesmo, por amor da beleza da ciência, e a seguir há sempre a possibilidade de uma descoberta científica vir a tornar-se, tal como o rádio, um benefício para a humanidade”.

O universo é um grande laboratório para o estudo de radiação de todas as formas e tipos. É estudando o universo que entendemos como funcionam as fusões nucleares, as interações das mais diversas partículas, campos magnéticos, a luz, a gravidade, entre outras centenas de coisas! Todo esse conhecimento é levado para outras áreas, como as de comunicações, de saúde, de agricultura… Na ciência nem sempre conseguimos prever os resultados e as aplicações futuras. Mas isso não significa que não há benefícios nas pesquisas, apenas que eles são imprevisíveis.

 

Ciência et al: Larissa Takeda

sobre a autora

Fontes consultadas:

Hart-Davis, A., Klesck, A. O livro da Ciência. São Paulo: Globo Livros, 2014.Capítulo 2.

Rooney, A. A História da Física. São Paulo: M. Books do Brasil, 2013. Capítulo 1.

https://www.academia.edu/3983602/Marie_Curie_o_discurso_no_Vassar_College

(Editoração: Viviane Santana, Eduardo Borges, André Pessoni e Caio Oliveira)

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