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Álcool em gel funciona mesmo?

A pandemia de H1N1 em 2009 fez com que muitos brasileiros criassem um novo hábito: o uso de álcool em gel. O medo de contaminação pela mortal gripe suína era geral, mas os médicos e cientistas asseguravam que o uso de gel alcóolico na concentração de 70% era um importante aliado contra a disseminação da doença. Dessa forma, inúmeros estabelecimentos passaram a ostentar volumosos recipientes de álcool em gel em seus balcões e incontáveis pessoas passaram a carregar, pendurados em suas bolsas e mochilas, frasquinhos portáteis dessa preparação – hábitos tais que perduram até os dias de hoje.

É fato que a lavagem correta das mãos é o melhor processo para a higienização e desinfecção, entretanto, nem sempre é possível fazê-lo. Lavar as mãos é o melhor caminho para evitar a auto-contaminação e a disseminação de doenças, porém demanda uma certa estrutura (como água limpa, pia, sabonete) e um certo tempo, muitas vezes, indisponíveis. Diante disso, o álcool em gel se torna uma ferramenta bastante útil nesses casos, pois está sempre à mão, é prático e simples.
Mas, afinal, o álcool gel funciona mesmo?

Sim, o uso de gel alcóolico é realmente eficiente na higienização de mãos, mas apenas quando utilizado corretamente. Devido a sua popularização, surgiram variadas apresentações de álcool em gel de modo a tornarem o produto mais atraente para o público. Contudo, alguns componentes, como corantes e odorificantes, podem comprometer a eficácia do produto por alterar a sua composição e a proporção entre os ingredientes da fórmula, além da possibilidade de causar alergias ou irritações. Ainda assim, produtos que contém fatores hidratantes para aliviar o ressecamento da pele causado pelo álcool podem sim ser utilizados.

O fator determinante para o efeito antisséptico é a concentração alcoólica do gel, que precisa ser igual a 70%. Essa diluição foi estabelecida como ideal depois que várias outras concentrações foram testadas empiricamente, de maneira que soluções alcoólicas a 70% mostraram-se mais efetivas para desinfecção. Concentrações inferiores e superiores de álcool não matam efetivamente os microorganismos, perdendo, portanto, sua função. É fácil compreender o motivo pelo qual preparações com menores concentrações de álcool não são eficazes na eliminação dos germes, mas muito se questiona sobre a ineficiência de proporções maiores de álcool e do álcool absoluto. A quantidade de água na diluição é exatamente o que permite a entrada do álcool na célula bacteriana, e o grau de hidratação da solução alcoólica é responsável pela sua passagem bem-sucedida através da parede e da membrana celular bacteriana. Uma vez que a solução alcoólica consegue entrar nas células, o álcool pode então exercer seus efeitos de desidratação, desnaturação de proteínas e coagulação de enzimas, levando à morte bacteriana. Além disso, a proporção de água retarda a volatização do álcool, permitindo que este permaneça em contato com os microorganismos por mais tempo, aumentando seu tempo de ação. Soluções alcoólicas mais concentradas não conseguem penetrar nas células, causam uma coagulação bacteriana superficial e evaporam muito rapidamente.
No entanto, mesmo que seja usado um álcool em gel simples e a 70%, nada adianta se o produto for mal utilizado. Isto é, espalhar rapidamente uma quantidade de gel nas palmas das mãos não é suficiente! Para que a desinfecção realmente aconteça, é necessário que a quantidade de álcool em gel, quando espalhada, cubra toda a superfície das mãos – inclusive entre os dedos e debaixo das unhas. Ainda, é necessário espalhar o produto friccionando as mãos, como se fosse uma lavagem com água, até que o álcool em gel seja totalmente absorvido pela pele.

O uso desse produto para a higienização das mãos tanto funciona como é amplamente utilizado na área médica. Profissionais da saúde muitas vezes não dispõem de tempo para lavarem as mãos com frequência, pois este é um processo trabalhoso e demorado. E o uso de luvas de maneira alguma dispensa a necessidade de higienização das mãos! Assim, entre uma tarefa e outra, dentistas, veterinários, biomédicos, enfermeiros, médicos e demais profissionais da saúde higienizam suas mãos com soluções alcoólicas, por serem mais práticas, não exigirem infraestrutura alguma e poderem ser utilizadas em trânsito ou alocadas ao lado do leito de pacientes, próximo às cadeiras de atendimento e bancadas de trabalho. Esse hábito diminui drasticamente o risco de contaminação cruzada entre pacientes, de autocontaminação por parte do profissional e de disseminação de doenças hospitalares.

É importante ressaltar que o álcool em gel pode ser utilizado como substituinte da lavagem de mãos apenas nas situações em que as mãos não estejam visivelmente sujas. Caso a pele ou as unhas apresentem alguma sujidade, é obrigatória a lavagem com água e sabão para que seja possível removê-la por completo.

Tenha em mente que lavar as mãos apenas com água não surte nenhum efeito, assim como é totalmente dispensável o uso de álcool em gel após a lavagem correta de mãos com água e sabão. Além disso, sabonetes comuns têm toda a eficácia necessária na higienização de mãos no dia-a-dia e, portanto, sabonetes antibacterianos devem ser reservados exclusivamente para o uso hospitalar. Seguindo essas dicas, higienizar as mãos nunca é demais!

 

Ciência et al: Laís Calissi Brisolla Tavares

sobre a autora

Fontes consultadas:

http://portal.anvisa.gov.br/noticias/-/asset_publisher/FXrpx9qY7FbU/content/higienizacao-das-maos-nota-orienta-profissionais/219201?p_p_auth=8x8rmx6t&inheritRedirect=false

https://hospitalsiriolibanes.org.br/sua-saude/Paginas/higienizacao-maos-mitos-verdades.aspx

https://foodsafetybrazil.org/afinal-por-que-o-alcool-70-e-mais-eficaz-como-bactericida-que-o-alcool-absoluto

(Editoração: Viviane Santana, Eduardo Borges)

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