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Atividade humana tem impacto na retenção de carbono da Mata Atlântica

#Farol de Notícias (Atualidades científicas que foram destaque na semana)

Conservação dos estoques de carbono do bioma é altamente afetada por degradação florestal, isso pode levar a emissões pelo menos 30% maiores que as geradas por mudanças climáticas

Um estudo brasileiro publicado na revista Science Advances mostra novas formas de compreender o conceito de “sequestro de carbono”, um aspecto estratégico no debate sobre mudanças climáticas globais. Entre os inúmeros benefícios das florestas nativas está o grande potencial de estocar carbono na biomassa de suas árvores, o que pode contrabalançar as emissões de gases de efeito estufa para a atmosfera. No trabalho, os pesquisadores usaram uma grande base de dados de inventários florestais para avaliar quais são os fatores que têm maior peso para explicar os estoques de carbono atuais na Mata Atlântica. Eles encontraram que os fatores ligados aos diferentes tipos de impactos humanos sobre a floresta têm o maior peso, sendo estes duas a seis vezes maiores que outros fatores (clima, solo e características das espécies de árvores que compõem a floresta).

Segundo Renato Augusto Ferreira de Lima, pesquisador do Departamento de Ecologia do Instituto de Biociências da Universidade de São Paulo (IB-USP), atualmente no Centre for the Synthesis and Analysis of Biodiversity (Cesab, com sede em Montpellier, França) e um dos dez cientistas que assinam o artigo, ainda se sabe muito pouco sobre quais são os fatores que podem levar florestas a estocar mais ou menos carbono. No entanto, os resultados da sua pesquisa trazem revelações sobre a importância do impacto das atividades humanas para esses estoques. Assim, reverter os efeitos dos impactos humanos nos remanescentes da Mata Atlântica seria a melhor estratégia para aumentar os estoques de carbono florestais. Atualmente, cerca de 50% da população brasileira reside em áreas originalmente ocupadas pelo bioma.

mata atlântica
Mapa da ecorregião da Mata Atlântica definida pelo WWF. A linha amarela representa os limites dessa ecorregião. Imagem de satélite da NASA. Fonte: wikimedia

A conservação dos estoques de carbono da Mata Atlântica é altamente dependente da floresta. A degradação florestal pode levar a perdas de carbono pelo menos 30% maiores do que qualquer futura mudança climática, segundo Marcela Venelli Pyles, doutoranda em ecologia aplicada do Departamento de Ecologia e Conservação da Universidade Federal de Lavras (UFLA), que lidera o estudo. Além disso, as emissões da degradação florestal podem comprometer os esforços de conservação de acordos de mitigação das mudanças climáticas, incluindo as metas desenvolvidas no âmbito da Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima e outras conferências.

Por exemplo, a intensificação de distúrbios dentro de um fragmento de Mata Atlântica pode levar a perdas de carbono de até 10,50 toneladas por hectare, correspondente a emitir 15,24% do carbono estocado em 1 hectare. Enquanto que a proteção do fragmento pode alcançar ganhos de carbono no montante de 12,02 toneladas por hectare (+17,44% de estocagem). 

Além da degradação pela ação humana, a pesquisa apurou o quanto os estoques de carbono da Mata Atlântica são ameaçados por outros fatores, como as mudanças climáticas, mais especificamente aumento de temperatura e estresse hídrico. Dentre os resultados, foi visto que se o aquecimento global for restringido a 1,5 °C acima dos níveis pré-industriais, como sugerido pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) das Nações Unidas, 3,53 toneladas por hectare (+5,12%) de carbono seriam liberadas apenas da Mata Atlântica. “Mas se o aquecimento global continuar em sua taxa atual, as emissões de carbono podem exceder 9,03 toneladas por hectare [+13,11% em emissões de carbono]”, complementa Pyles.

O artigo ainda indica que as iniciativas com o objetivo de mitigar as mudanças climáticas por meio da restauração de florestas poderiam se beneficiar da inclusão de espécies com maior densidade de madeira, sementes mais pesadas e folhas maiores. O grupo de pesquisadores alerta que as políticas de conservação de carbono devem levar em conta aspectos metodológicos usados para a quantificação dos estoques de carbono. “As diferenças entre metodologias utilizadas em campo podem levar a erros na estimativa de carbono e, consequentemente, à má interpretação e ineficiência de ações de mitigação do clima”, explica Pyles.

O estudo também aponta que a relação entre a biodiversidade e os estoques de carbono é fraca na Mata Atlântica. Isso revela que as políticas de conservação focadas apenas no carbono podem falhar na proteção da biodiversidade e destaca a importância de implementação de mecanismos de incentivos complementares e separados que visem alcançar também a preservação de espécies. Segundo Lima, os resultados encontrados para a Mata Atlântica podem servir de lição para outras florestas do mundo – diante das crescentes intervenções humanas nas florestas tropicais ao redor do planeta, oferecendo soluções baseadas na natureza no combate às mudanças climáticas.

 

Colaboração: Jéssica de Moura Soares sobre a autora

Jéssica de Moura Soares é Bacharel em Biotecnologia pela Universidade Federal do Ceará (UFC), Mestre e agora doutoranda em Bioquímica pela Universidade de São Paulo (USP). Se interessa por iniciativas onde a ciência ajuda a transformar o mundo em um lugar mais sustentável e igualitário. Entusiasta da divulgação científica, acredita que a ciência tem que ser de fácil acesso a todos.

 

Fontes e mais informações sobre o tema:

Matéria no site Agência FAPESP, intitulada “Estudo quantifica impacto humano sobre a capacidade de retenção de carbono da mata atlântica”, publicada em 21/06/22. https://agencia.fapesp.br/estudo-quantifica-impacto-humano-sobre-a-capacidade-de-retencao-de-carbono-da-mata-atlantica/38916/

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