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Secas, enchentes, mudanças climáticas e a diminuição da área de florestas na região amazônica: um perigo para o presente e para o futuro?

#Pesquisa ao seu alcance (Artigos científicos em linguagem simplificada)

Sobre
Categoria: Artigo – Revista Eletrônica Frontiers for Young Minds
Título original: Drought, Floods, Climate Change, and Forest Loss in the Amazon Region: A Present and Future Danger?
Ano de publicação: 2019
Link do artigo original: https://kids.frontiersin.org/articles/10.3389/frym.2019.00147

Resumo

A Amazônia é a maior floresta tropical do mundo e desempenha um papel importante no clima global e regional, incluindo a troca de água entre a floresta e a atmosfera. Climas extremos, como secas ou inundações, podem ser perigosos para os humanos e para os sistemas naturais. Secas e inundações podem alterar a troca de umidade entre as florestas e a atmosfera e podem afetar a sobrevivência da Floresta Amazônica. Ações para evitar ou reduzir o aquecimento global e a perda de florestas são discutidas neste artigo.

POR QUE DEVEMOS NOS PREOCUPAR COM A FLORESTA AMAZÔNICA?

Quando as pessoas pensam sobre a Floresta Amazônica, muitas vezes a consideram como o pulmão do planeta, removendo dióxido de carbono (CO2) do ar e liberando oxigênio para animais, incluindo humanos, respirarem. As pessoas também pensam em cobras, macacos, aranhas, orquídeas e na incrível diversidade de vida hospedada pela floresta tropical. Tudo isso é importante, mas há mais do que isso.

A floresta tropical interage com a atmosfera de diversas formas, afetando o clima local e mundial. A Figura 1 mostra que a floresta tropical interage com a atmosfera para fornecer umidade para a bacia amazônica. Os ventos próximos à superfície do oceano trazem umidade do Oceano Atlântico para a Amazônia. Parte dessa umidade cai na forma de chuva, parte pode ser rapidamente devolvida à atmosfera pela floresta tropical por meio dos processos de evaporação e liberação das folhas e do solo. Parte desse vapor d’água voltará como chuva para a floresta tropical e parte irá para as regiões vizinhas. Entre 30% e 70% das chuvas na bacia amazônica consistem em água que evaporou da floresta tropical.

Figura 1 – Ciclo regional da água na região amazônica. A umidade é transportada para a região amazônica pelos ventos alísios do Atlântico tropical. Depois das chuvas, a floresta tropical produz intensa evaporação e transpiração e reciclagem de umidade. Depois disso, grande parte da evaporação e da transpiração retorna para a região amazônica em forma de chuva.

A floresta tropical pode influenciar a temperatura e as chuvas, ajudando a modificar o seu próprio clima, o que também serve para modificar o clima de todo o continente. Se as florestas desaparecerem, isso pode aumentar o risco de uma grande crise climática para todo o planeta. Como as árvores removem o CO2 da atmosfera, os cientistas estão preocupados que a perda progressiva da Floresta Amazônica possa tirar um valioso absorvedor de CO2. Além disso, a perda da floresta tropical pode afetar os ciclos naturais de chuvas na região amazônica de formas que podem colocar em risco o funcionamento da floresta. Essas mudanças nas chuvas podem levar a um clima mais seco e quente na região e a um maior risco de incêndio e erosão.

COMO OS EXTREMOS CLIMÁTICOS E AS MUDANÇAS CLIMÁTICAS AFETAM A REGIÃO AMAZÔNICA?

Extremos climáticos severos (muito úmidos ou muito secos) afetaram a região amazônica nos últimos anos. As secas de 2005, 2010 e 2016 e as enchentes em 2009, 2012 e 2014 fornecem exemplos de como as mudanças climáticas podem afetar o ecossistema e as pessoas que vivem na região. Luiz Aragão [3] mostrou que, durante a estiagem de 2016, o número de queimadas aumentou 36% em relação aos 12 anos anteriores na região. A estação seca na região sul da Amazônia, onde as taxas de desmatamento são as mais altas, tem durado cerca de 3 a 4 semanas a mais que antigamente, com as chuvas chegando mais tarde do que o normal [4]. Esta longa estação seca aumenta o risco de incêndios. Em climas futuros mais quentes, as secas podem ser mais frequentes e/ou intensas, e temporadas mais longas de seca podem aumentar o risco de incêndios, que podem impactar as pessoas que vivem naquela área e a biodiversidade de toda a região amazônica.

Para estudar como será o clima no futuro, grupos de pesquisa ao redor do mundo usaram a matemática. Como? Eles representam todos os processos naturais usando equações que descrevem o equilíbrio de calor e umidade na região e a troca de calor e umidade entre o solo, a vegetação e o ar, além das trocas com regiões vizinhas. As equações devem ser resolvidas em supercomputadores. Essa representação matemática da natureza é conhecida como modelo climático. Modelos climáticos mostram que o aquecimento global ou o desmatamento podem levar a condições mais secas e quentes na região central e oriental da Amazônia. Em artigo publicado em 2018 [4], foi mostrado que oscilações mais extremas entre seca e enchentes podem chegar a um ponto sem volta (ou ponto de inflexão), após o qual as mudanças climáticas serão irreversíveis. Isso pode ameaçar a própria existência da floresta tropical amazônica.

O QUE SÃO OS RIOS AÉREOS E QUAL O PAPEL DELES NA CHUVA?

O trabalho pioneiro do cientista brasileiro Prof. Enéas Salati, em 1979 [2], explicou o balanço hídrico na região amazônica. Uma quantidade significativa de água evaporada da floresta volta como chuva, e esse processo é conhecido como reciclagem de umidade. Outro cientista [5] mostrou como a reciclagem da umidade tem permitido que a floresta sobreviva até os dias de hoje. A Figura 2 mostra uma visão artística do transporte de umidade na região amazônica. A umidade evaporada do Oceano Atlântico é carregada pelos ventos de superfície para a região. Os ventos obtêm ainda mais umidade com a reciclagem de umidade fornecida pela floresta. O ar úmido primeiro se move para o oeste, mas ao se aproximar do flanco leste das montanhas dos Andes, ele é desviado para o sudeste da América do Sul. Esse transporte é como um rio no ar que traz umidade e chuva para o sul e para as regiões centrais do Brasil, e também parte da Argentina.

Figura 2 – Como a umidade é transportada para dentro e para fora da Amazônia.
A água evapora do Oceano Atlântico tropical e é transportada para a região amazônica pelos ventos alísios. Esses ventos produzem chuvas na região, mas também ganham água com a reciclagem da floresta. Esta corrente de ar úmido se move em direção ao lado leste dos Andes e depois muda de direção forçada pelos Andes e canalizando o transporte de umidade para o sul do Brasil e norte da Argentina, comportando-se como um “rio de umidade” ou “rio aéreo” (fonte: https://blogs.canalrural.com.br/embrapasoja/2017/05/19/como-os-rios-aereos-colaboram-com-o-brasil-agricola/).

Josefina Arraut refinou o conceito de rios aéreos em 2012 [6]. São como rios na terra, exceto que esse fluxo de umidade está na forma de vapor d’água e nuvens que ocorrem na atmosfera. O volume de umidade transportado na atmosfera pelo rio aéreo ao lado leste dos Andes é de cerca de 230.000 m³/s, que é aproximadamente o mesmo que o fluxo de água do Rio Amazonas para o Oceano Atlântico!

O QUE PODE ACONTECER COM O CLIMA SE AS FLORESTAS DESAPARECEM?

O desmatamento é visto como uma ameaça ambiental. Reduz a reciclagem da umidade da vegetação para a atmosfera e também reduz o volume de água transportado no rio aéreo. Se a Amazônia fosse total ou parcialmente desmatada, os problemas climáticos que isso causaria seriam sentidos distantes, como nos Estados Unidos ou mesmo na China [7]. Na América do Sul, cortar até mesmo porções da floresta amazônica pode afetar a qualidade da estação chuvosa no sul do Brasil e no norte da Argentina.

À medida que as florestas começam a desaparecer, há menos água na atmosfera e, consequentemente, significa menos chuva, tornando difícil o cultivo para os agricultores. Isso poderia reduzir a quantidade de alimentos disponíveis para humanos e outros animais, e muitas empresas agrícolas também poderiam perder dinheiro. Além de causar problemas, como secas ou tempestades prolongadas, um planeta desmatado pode aumentar ainda mais o aquecimento global.

No início deste século, vários cientistas [8, 9] já viram que a mudança climática poderia atingir níveis perigosos se as temperaturas globais do ar aumentassem em média 4°C. O clima mundial passaria por um ponto crítico e a Floresta Amazônica poderia entrar em colapso, possivelmente transformando a maior parte do sul e do leste da Amazônia em uma savana [10].

O QUE PODEMOS FAZER PARA EVITAR MUDANÇAS CLIMÁTICAS PERIGOSAS?

As mudanças climáticas representam um grande perigo para o nosso meio ambiente. Portanto, regulamentos em todos os países são necessários para reduzir as emissões de gases de efeito estufa e evitar a perda de florestas para dar aos humanos uma chance de um futuro mais sustentável. Em dezembro de 2015, muitos países participaram da Conferência das Partes, que se reuniu em Paris, onde foram discutidas as principais preocupações sobre as mudanças climáticas e seus impactos em todo o mundo. Como resultado dessa reunião, o Acordo de Paris estabeleceu medidas para reduzir o aquecimento global e propôs que os países devem fazer esforços para reduzir as emissões globais de CO2 e parar ou reduzir o desmatamento global. Se o Acordo de Paris for seguido, o aquecimento global nas próximas décadas deve ser inferior a 2°C, o que reduziria o risco de consequências perigosas para o clima.

CONCLUSÕES

As mudanças climáticas vividas pela região amazônica terão efeitos sobre a floresta tropical, bem como sobre a população e a biodiversidade dos organismos que nela habitam. A pesquisa deve se concentrar na compreensão dos impactos das mudanças climáticas na região amazônica, particularmente os efeitos da seca e do fogo em humanos e animais. Além disso, secas, inundações e seus impactos sobre as pessoas e os ecossistemas devem ser melhor explorados. Se o clima continuar a esquentar, o risco de enchentes, incêndios e secas intensos deve aumentar e medidas devem ser tomadas para minimizar os impactos desses eventos. Os incêndios contínuos e o desmatamento na Amazônia podem prejudicar o combate às mudanças climáticas. Devemos proteger e restaurar a grande Floresta Amazônica para ajudar a garantir que as mudanças climáticas não afetem nossa sobrevivência.

 

Tradução:

Beatriz Spinelli  sobre a tradutora           

Licenciada em Letras e mestra em Saúde, interdisciplinaridade e reabilitação pela Unicamp, pesquisando o ensino de língua portuguesa como segunda língua para surdos. Trabalha como editora de materiais didáticos na área de Linguagens e suas Tecnologias e tem um carinho muito grande pela educação especial, principalmente a educação bilíngue para surdos. Tem interesse por novas tecnologias voltadas à educação e por divulgação científica.

Artigo Original:

↑Marengo, J. A., Souza, C. Jr., Thonicke, K., Burton, C., Halladay, K., Betts, R., et al. 2018. Changes in climate and land use over the Amazon region: current and future variability and trends. Front. Earth Sci. 6:228. doi: 10.3389/feart.2018.00228

Fontes:

[1] ↑ Marengo, J. A., Nobre, C. A., Chou, S. C., Tomasella, J., Sampaio, G., Alves, L., et al. 2011. Dangerous Climate Change in Brazil, A Brazil-UK Analysis of Climate Change and Deforestation Impacts in the Amazon. Sao Jose dos Campos: INPE, 54.

[2] ↑ Salati, E., Dall’Olio, A., Matsui, E., and Gat, J. R. 1979. Recycling of water in the Amazon basin: an isotopic study. Water Resour Res. 15:1250–8. doi: 10.1029/WR015i005p01250

[3] ↑ Aragão, L. E. O. C., Anderson, L. O., Fonseca, M. G., Rosan, T. M., Vedovato, L. B., Wagner, F. H., et al. 2018. 21st Century drought-related fires counteract the decline of Amazon deforestation carbon emissions. Nat. Commun. 9:536. doi: 10.1038/s41467-017-02771-y

[4] ↑ Marengo, J. A., Souza, C. Jr., Thonicke, K., Burton, C., Halladay, K., Betts, R., et al. 2018. Changes in climate and land use over the Amazon region: current and future variability and trends. Front. Earth Sci. 6:228. doi: 10.3389/feart.2018.00228

[5] ↑ Nobre, A. D. 2014. The Future Climate of Amazonia: Scientific Assessment Report. São José dos Campos: CCST-INPE.

[6] ↑ Arraut, J. M., Nobre, C., Henrique de Melo Jorge, B., Obregon, G., and Marengo, J. A. 2012. Aerial rivers and lakes: looking at large-scale moisture transport and its relation to Amazonia and to subtropical rainfall in South America. J. Clim. 25:543–56. doi: 10.1175/2011JCLI4189.1

[7] ↑ Lawrence, D., and Vandecar, K. 2015. Effects of tropical deforestation on climate and agriculture. Nat. Clim. Change 5:27–36. doi: 10.1038/nclimate2430

[8] ↑ Cox, P. M., Betts, R. A., Jones, C. D., Spall, S. A., and Totterdell, I. J. 2000. Acceleration of global warming due to carbon-cycle feedbacks in a coupled climate model. Nature 408:184–7. doi: 10.1038/35041539

[9] ↑ Oyama, M. D., and Nobre, C. A. 2003. A new climate-vegetation equilibrium state for Tropical South America. Geophys. Res. Lett. 30:2199. doi: 10.1029/2003GL018600

[10] ↑ Lovejoy, T. E., and Nobre, C. A. 2018. Amazon tipping point. Sci. Adv. 4:2340. doi: 10.1126/sciadv.aat2340

(Editoração: Beatriz Spinelli, Eduardo Borges e Nathália Khaled)

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