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A monogamia dos tordos azuis está mais para um relacionamento aberto - Ilha do Conhecimento
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A monogamia dos tordos azuis está mais para um relacionamento aberto

Machos de Tordos Azuis Ocidentais que produzem filhotes extra-par também têm sucesso em reproduzir com seu par

 

Resumo

Mesmo em sistemas sociais monogâmicos, é possível que ocorra reprodução extra-par (EP), desde que isso não seja custoso – por exemplo, se o animal que tenta reproduzir EP reduz seu sucesso reprodutivo intra-par (IP). Este trabalho utilizou observações de paternidade obtidas ao longo de 6 anos acompanhando um bando de pássaros da espécie Sialia mexicana, conhecidos como Tordos Azuis Ocidentais, a fim de avaliar as consequências reprodutivas da paternidade EP. Os dados mostraram que machos com reprodução EP produziram quase duas vezes mais jovens do que machos que não conseguem EP; mais ainda, machos que conseguem EP têm também mais filhos IP, mais ninhos bem-sucedidos e mais filhotes por ninho. Os dados também mostraram que machos obtendo EP eram significativamente mais velhos do que os que não a obtêm, sugerindo que um viés por longevidade seja importante para essa população de pássaros.

 

Introdução

É de conhecimento popular que muitos animais, em especial os pássaros, são monogâmicos. O que é menos conhecido é que esta monogamia, na maioria das vezes, não consiste em um par fielmente reproduzindo apenas um com o outro. Ao contrário, a maioria das espécies de pássaros reproduzem-se com diversos pares, mesmo que mantenha um único par social – ou seja, com quem além de reproduzir, constrói o ninho e cria os recém-nascidos, por exemplo. 

Como estes sistemas monogâmicos funcionam na natureza, e por qual razão indivíduos traem dentro destes sistemas, ainda é uma questão mal resolvida. Principalmente porque ainda é necessário obter mais dados para avaliar as diversas hipóteses que teóricos já elaboraram – tanto em volume de dados, quanto em diversidade.

A paternidade extra-par (EP), ou seja, procriar com uma fêmea diferente do seu par social, pode aumentar significativamente o sucesso reprodutivo de um macho em uma população monogâmica. Entretanto, este comportamento reprodutivo só deve se manter na população se ele for mais vantajoso do que manter apenas as reproduções intra-par (IP), com sua fêmea social. Isto funciona em algumas aves, como o Agelaius phoeniceus, onde machos que obtêm EP têm mais filhotes do que aqueles que não conseguem EP; por outro lado, outras espécies, como o Junco hyemalis têm machos que conseguem número de filhotes EP equivalente ao que eles perdem em IP ao “pular a cerca”.

Diferentes cenários podem explicar o maior sucesso de machos EP: entre os Hirundo rustica erythrogaster, machos que conseguem EP também se reproduzem mais cedo na estação do que os que não conseguem, e as fêmeas que reproduzem mais cedo são também as mais férteis. Em outros cenários, machos que conseguem EP não têm mais filhotes no ninho, mas têm uma proporção maior de filhotes sobrevivendo do que os não-EP, como é o caso dos Carpodacus erythrinus e dos Cyanistes caeruleus

O comportamento promíscuo dos machos, entretanto, depende também da aceitação sexual das fêmeas. Se as fêmeas têm uma preferência sexual específica, pode-se predizer que poucos machos terão muito sucesso em reprodução EP – aqueles que atendem às demandas das fêmeas. Esta seria a explicação conhecida como “Bons Genes”: as fêmeas procuram características específicas nos machos, e quando não as conseguem com seus pares sociais, têm mais chance de aceitar um macho EP. Por outro lado, se a população não tem uma seleção sexual tão definida, pode estar em ação a hipótese da Compatibilidade Genética: fêmeas aceitam machos EP o mais diferente que conseguem do seu par social, aumentando assim a diversidade genética em seus ninhos. Nesse caso, seria esperado que todos os machos, bem ou mal sucedidos em reprodução EP, tenham proporções parecidas de filhotes “bastardos” em seus ninhos.

Usando dados de seis anos consecutivos de um trabalho de longo prazo sobre Tordos Azuis Ocidentais, este estudo testou a previsão da hipótese dos bons genes, em que machos com grande sucesso em EP também são bem-sucedidos IP, comparados com machos que não conseguem EP. 

 

Material & Métodos 

Durante as temporadas reprodutivas dos anos entre 2000 e 2005, os tordos se reproduziram receberam anilhas e foram identificados. Caixas para ninhos foram monitoradas para postura e eclosão de ovos. Foram anilhados 1104 filhotes, que tiveram o sangue coletado para testes de paternidade. O número de ninhos foi constante ao longo dos anos, e 22% deles foram cuidados por machos bem-sucedidos em reproduzir EP.

A idade dos machos pôde ser determinada com relativa facilidade, pois eles apresentam forte filopatria. Adultos reprodutores formam pares sociais duradouros – cerca de 6% dos casais avistados tiveram “divórcio” em estações seguintes. Dados de 11 anos mostram que cerca de 7% dos ninhos têm um ajudante adulto – em geral um filhote de outra estação que não conseguiu formar seu próprio ninho.

Além da idade, outros fatores que podiam influenciar o sucesso em EP foram controlados, tais quais data da cópula e densidade de ninhos (isto é, número de ninhos na área), o que pode afetar as chances de um macho trair e ser traído. Para calcular as densidades de ninhos, foram usadas suas posições marcadas com GPS, e depois medidas as distâncias em metros.

 

Resultados

Machos com sucesso em reprodução EP eram significativamente mais velhos do que os outros, mas os pares sociais (fêmeas) dos dois grupos não eram diferentes. Enquanto cerca de 20% dos machos obtiveram sucesso em EP em cada estação reprodutiva, eles tinham quase 50% de chance de serem traídos. Machos que conseguiram evitar serem traídos não tinham idade diferente dos que não conseguiram. Não houve diferença na data da primeira postura de ovos de machos com ou sem EP. Também a densidade de ninhos de machos EP e sem EP não foi diferente.

Machos que conseguiram EP tiveram cerca de 1,8 vezes o número de filhotes dos que não conseguiram EP, em cada estação reprodutiva. Nenhuma outra variável (data da postura, densidade de ninhos, idade dos machos ou das fêmeas) afetou o sucesso reprodutivo dos pássaros estudados. Machos com EP não perderam seu sucesso reprodutivo IP; pelo contrário, eles tiveram maior sucesso do que machos sem EP mesmo dentro de seus próprios ninhos. 

 

Discussão

Machos que conquistam EP têm um maior sucesso reprodutivo do que os que não conseguem. Mesmo se levássemos em conta possíveis ninhos EP fora dos limites do estudo, a vantagem ainda seria notável nos ninhos IP destes machos, que têm maior proporção de paternidade (isto é, menos ovos fecundados por outros machos), e maior índice de sobrevivência de seus filhotes IP. 

Embora nenhum desses fatores sozinhos tenha sido significativo, a maior proporção de filhotes no ninho IP dos animais que conseguem EP se deve à combinação de menor taxa de traição por ninho, e menor chance de ser traído, que estes animais têm em comparação com aqueles que não conseguem reprodução EP – resultados que derivam da preferência sexual das fêmeas, mais do que da própria ação dos machos.

Combinados, estes resultados dão evidências de que a hipótese dos Bons Genes seria válida nesta população: as fêmeas que se reproduzem com machos mais velhos (ou seja, que vivem mais – os “bons genes” deste caso) os traem menos; por outro lado, são justamente estes machos que conseguem “pular a cerca” com maior frequência.

Os autores apontam, ainda, que estes resultados são baseados principalmente na produção e sobrevivência de filhotes, mas que estudos mais completos deveriam levar em conta a maturação destes até a fase reprodutiva e o sucesso reprodutivo destes animais, para calcular o sucesso de seus pais. Estudos tão completos, infelizmente, ainda são muito raros.

 

Pesquisa ao seu alcance: Fernando F. Mecca

sobre o autor

Artigo original

O texto apresentado é uma adaptação do artigo “Male western bluebirds that sire extrapair young are also successful within-pair mates”, publicado pela revista Animal Behaviour em 2014, de autoria de Elise D. Ferree e Janis L. Dickinson. O artigo original pode ser acessado em https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S0003347214000438.

(Editoração: Priscila Rothier, André Pessoni e Caio Oliveira)

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