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Como escolher animais embaixadores para conservação?

#Ao seu alcance (Artigos científicos em linguagem simplificada)

Identificando espécies embaixadoras para o marketing de conservação

Destaques
– Para reduzir ameaças à biodiversidade e promover a conservação ambiental é necessário engajamento e financiamento global significativos;
– Campanhas de marketing são estratégias utilizada para aumentar o engajamento das pessoas com diferentes causas ambientais;
– Estas campanhas precisam considerar com cuidado qual espécie é escolhida para representar a causa. Pensando não só na percepção que o público alvo tem de determinada espécie, mas também qual o propósito da campanha e do uso daquele animal;
– O trabalho aqui detalhado propõe a seleção de espécies embaixadoras baseada no seu apelo e carisma, mas também no seu potencial em representar outras espécies e problemáticas ambientais.

Para reduzir ameaças à biodiversidade e promover a conservação ambiental é necessário engajamento e financiamento global significativos. Não apenas de governos, mas também do público em geral, que está sendo empoderado para se engajar em causas políticas e sociais por meio da internet e mídias sociais.  Uma estratégia do marketing em prol da conservação é o uso de espécies-bandeira (espécies carismáticas que representam a causa). Porém, para aumentar o engajamento do público (e o impacto de seu apoio), campanhas de conservação precisam considerar cuidadosamente quais espécies selecionar. 

Com isso, aqui vão alguns pontos importantes a serem considerados pelo marketing de conservação: 

  1. É preciso considerar os gostos e percepções do seu público alvo, mas também qual o propósito da escolha de determinada espécie como bandeira da causa. Por exemplo: Ursos polares podem ser bons candidatos a serem espécies-bandeira em campanhas internacionais sobre as mudanças climáticas, mas lobos podem não ser uma escolha tão boa assim quando o público alvo é uma comunidade de donos de ovelhas em uma campanha para reintrodução de animais na área. 
  2. Certas espécies têm características que as tornam mais ou menos bem-sucedidas como bandeira (exemplo: raridade, tamanho…). 
  3. É importante considerar a flexibilidade da espécie selecionada como bandeira de representar outras espécies e problemáticas ambientais (por vezes menos ‘carismáticos’).  Este é o caso de espécies guarda-chuvas: aquelas que, se protegidas, podem proteger outras espécies e o seu ecossistema. 

Assim, o termo “espécie embaixadora” usado neste texto se refere a espécies que são apelativas para o público e muito flexíveis (que conseguem representar uma grande quantidade de outros animais), sendo assim uma união entre os termos espécie-bandeira e espécie guarda-chuva. O trabalho aqui detalhado foi um dos primeiros estudos a unir estes fatores de forma sistemática para escolha de espécies que possam ser boas alternativas de representar campanhas de conservação. 

 

Metodologia

Os autores estimaram o potencial para serem embaixadores (unindo fatores de flexibilidade e apelo) de 4.320 mamíferos terrestres. 

A flexibilidade foi medida para cada espécie, de acordo com sua capacidade de representar outros mamíferos. Os autores calcularam o apelo dos animais com base em outra pesquisa que avaliou o carisma de 1.000 espécies de mamíferos. A partir dessa pesquisa, eles elencaram atributos que poderiam ser generalizados para o grupo todo: status de conservação (exemplo: vulnerável ou em risco de extinção), tamanho do corpo, posição do olho e nível de ameaça aos humanos. Dados relativos às avaliações destas características para as diferentes espécies foram coletados a partir de questionários aplicados com pessoas em 5 países (Austrália, Estados Unidos, África do Sul, Índia e Reino Unido). 

 

Resultados e Discussão

Analisando os dados para todos os 5 países, 331 espécies foram identificadas como possíveis embaixadoras. Para cada país o número variou de: 256 entre os respondentes da Austrália; 331 na Índia; 338 na África do Sul; 240 no Reino Unido e 338 nos Estados Unidos. Apenas um grupo pequeno de espécies alcançou as notas mais altas para serem considerados “melhores embaixadores”, 27 na análise que considerou todos os países (23 – Austrália, 77 – Estados Unidos, 33 – África do Sul, 32- Índia e 26 – Reino Unido). 

Os mamíferos carnívoros foram os preferidos representando mais de 50% dos “melhores embaixadores” (mesmo eles representando apenas 5% da amostra total de mamíferos terrestres analisados). Os autores do trabalho destacam a preferência dos respondentes para a onça parda (Puma concolor) e o leopardo (Panthera pardus). 

Ainda, são feitas as seguintes considerações: 

  1. Espécies com alta flexibilidade foram, geralmente, aquelas generalistas e com grandes áreas de vida. O camundongo doméstico (Mus musculus) teve uma das mais altas notas para flexibilidade, mas claramente um rato não é um símbolo de conservação, o que evidencia a importância de uma análise do marketing que considere diferentes fatores. 
  2. No geral, houve consenso entre os países que as espécies com maiores notas de apelo (ou carisma) eram: raras, grandes, com olhos voltados para frente e que poderiam ser ameaça aos humanos (exemplo: elefante indiano e tigre). 
  3. A presença de onças pardas e leopardos como espécies frequentemente entre os melhores embaixadores reforça dados da literatura de que os felinos são populares entre as pessoas. Porém, é importante considerar também que são muito usados (assim como outros mamíferos carnívoros) para representar marcas privadas como: carros Jaguar, artigos de esporte Puma, atribuindo outras associações culturais a esses animais. 
  4. Além disso, para ser considerado um bom embaixador, o animal não precisa estar ele mesmo como prioridade para conservação. Apenas entre 16% e 22% das espécies selecionadas pelos respondentes dos 5 países como embaixadoras eram consideradas como ameaçadas de extinção. 
  5. Os autores ainda refletem sobre como diferentes abordagens do marketing se aplicam para diferentes grupos de espécies. Por exemplo, um grupo de espécies carismáticas, porém, com baixa flexibilidade, eram frequentemente associadas ao status de ameaçadas de extinção. Provavelmente decorrente de serem espécies que tem área de vida mais restrita, estão mais vulneráveis a ameaças externas e que são menos prováveis de ocorrerem em áreas com espécies simpátricas (espécies que ocorrem em uma mesma área geográfica e se encontram regularmente). Estes fatores, que exacerbam seu grau de ameaça de extinção, podem torná-las bons emblemas para abordagens de marketing associadas a problemáticas globais mais gerais (do tipo “proteja a natureza”, em contraste com os casos anteriores do tipo “ajude este bioma em específico”). 

Assim, em um mundo altamente interconectado e influenciados por campanhas de marketing virais, novas abordagens podem renovar a discussão de como espécies podem ser melhor utilizadas em campanhas de marketing que promovam a conservação ambiental. 

 

Colaboração:

Bruna Lima Ferreira  sobre a autora           

Bruna é bacharela e licenciada em Biologia pela Universidade de São Paulo (USP). É mestre pelo Programa de Pós – Graduação em Psicobiologia da USP. É fascinada pelas relações que as pessoas têm com a natureza e pela busca de estratégias que promovam comportamentos mais sustentáveis e a reaproximação (e valorização) da sociedade e natureza. Acredita no papel da popularização científica e ensino de ciências para construção de uma ciência democrática.

Artigo Original:

O texto apresentado é uma adaptação do artigo “Identifying ambassador species for conservation marketing”, publicado pela revista Global Ecology and Conservation em dezembro de 2017, de autoria de Macdonald, E.A et al. O artigo original pode ser acessado em https://www.sciencedirect.com/science/article/pii/S2351989417302470

(Editoração: Fernando F. Mecca e Nathália Khaled)

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